quinta-feira, 30 de julho de 2009

Barcelona!

Parto amanhã de manhã para Barcelona, tomo ali um trem, logo depois, para a cidade de Castelló, nos arredores de Valência, onde me apresento à noite no Espai d´Art Contemporani. Será minha apresentação mais longa até o momento. Passo o fim-de-semana em Barcelona, volto a Berlim na terça-feira. Talvez fique fora do ar por uns dias. Abaixo, dois poetas daquelas bandas:


(Bartomeu Ferrando, "Sintaxi")

§

Ócio

Ela dorme. A hora em que os homens
já estão despertos, e pouca luz
entra por ora a feri-los.
Com tão pouco temos tanto. Apenas
o sentimento de duas coisas:
a terra gira, mulheres dormem.
Reconciliados, seguimos
direto ao fim do mundo, que não
requer nossa ajuda.

(tradução de Ricardo Domeneck)

Oci

Ella dorm. L'hora que els homes
ja s'han despertat, i poca llum
entra encara a ferir-los.
Amb ben poc en tenim prou. Només
el sentiment de dues coses:
la terra gira, i les dones dormen.
Conciliats, fem via
cap a la fi del món. No ens cal
fer res per ajudar-lo.


(Gabriel Ferrater, in Teoria dels cossos, 1966)

segunda-feira, 27 de julho de 2009

Berlinenses e suas obsessões est-É-ticas

Um dos espaços de artes visuais de que mais gosto, aqui no Berlimbo, é a Berlinische Galerie, museu de arte moderna, fotografia e arquitetura que se dedica, primordialmente, a recuperar e divulgar o trabalho de artistas visuais que nasceram ou produziram em Berlim.

No caso de exposições coletivas de grande porte, este enfoque acaba tendo um efeito bastante negativo, gerando abordagens provincianas. No entanto, já tive a oportunidade de ver, ali, retrospectivas de artistas excelentes, como foi o caso da exposição que resgatou o trabalho fotográfico do alemão Herbert Tobias (1924 - 1982), que fotografou a vida subterrânea da Berlim do pós-guerra, onde pôde criar imagens de rapazotes e moçoilas que, uma década mais tarde, tornar-se-iam importantes na História da Alemanha, jovens (até então desconhecidos) como o ator Klaus Kinski, a cantora-ícone Nico e aquele que viria a se tornar um dos líderes da Facção do Exército Vermelho: Andreas Baader.


(Herbert Tobias, "Andreas Baader em Berlim", 1961)

§


(Herbert Tobias, "Klaus Kinski e Thomas Harlan", 1952)

§


(Herbert Tobias, "The Berlin-Party is over!", 1961)


Dedicando-se à arte produzida em Berlim, há naturalmente um foco no grupo berlinense de DADA. Foi ali que, no ano passado, foi possível ver a impressionante retrospectiva de Hannah Höch (1889 - 1978).


(colagem de Hannah Höch, 1919)



(Hannah Höch, "A menina linda", 1919)

Berlim produz, eu creio, uma característica bastante marcante na personalidade de seus artistas. Aqui, sempre houve uma obsessão pela investigação da historicidade do fazer artístico. Foi a cidade que gerou críticos como Walter Benjamin e dramaturgos como Bertolt Brecht e Heiner Müller. O grande romance modernista berlinense é a obra Berlin Alexanderplatz, de Alfred Döblin, publicada em 1929, que destrinça a Alemanha da República de Weimar. Em Berlim, a revolta ética e estética dadaísta assumiu seus contornos mais combativos e politizados, nas obras de Raoul Hausmann, Hannah Höch e John Heartfield; da mesma maneira, o expressionismo de Otto Dix e George Grosz. Isso pode ser sentido com força na arte alemã em geral, em artistas do pós-guerra como Joseph Beuys, Gerhard Richter e Sigmar Polke, ou no cinema de Alexander Kluge e Rainer Werner Fassbinder, que morreu na cama, com um cigarro na boca e o roteiro de seu próximo filme nas mãos, que se chamaria "Rosa Luxemburg".


(John Heartfield, "Auto-retrato", 1920)

Este mês, a Berlinische Galerie está mostrando os trabalhos de dois artistas ligados à cidade. Um deles é o dadaísta John Heartfield (1891 - 1968), pouco mencionado na historiografia das artes visuais, sempre mais preocupada com movimentos gerais, do que com os artistas que os formaram. Heartfield foi um dos artistas gráficos mais importantes dentre os dadaístas. Foi também um combatente incansável e dissidente contra a propaganda nazista, criando sua contra-propaganda.



Fotomontagens de John Heartfield


(John Heartfield, "Carvalhos alemães", 1933)

§



(John Heartfield, "Acabou a manteiga, comamos aço", 1933)

§


(John Heartfield, "Göring, o carrasco do Terceiro Reich")

São pessoas que não buscam tanto o papel do artista obcecado com sua tekhne e seu daimon, mas que decidem se tornar interventores (gosto do neologismo "intervencionista"), fascinados pela conjunção entre ética e estética, história e arte. Precisamos dos dois grupos, tanto dos artistas, como destes interventores.

O outro berlinense, este de adoção, recebendo uma retrospectiva no espaço é o continuador, de certa forma, do trabalho de dadaístas como John Heartfield: o artista gráfico Klaus Staeck.


(Klaus Staeck, "Vaterland")

.
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domingo, 26 de julho de 2009

"Texto em que o poeta medita sobre algumas escolhas estéticas / na companhia de Angélica Freitas / em Buenos Aires" e um predileto recente

Texto em que o poeta medita sobre algumas escolhas estéticas
na companhia de Angélica Freitas
em Buenos Aires


(e o dedica a Cristian De Nápoli)

hilstado a comparecer
à óbvia
escolha y elección
entre o/el
cânon o thénon
não
quis adular la aduana
a convencer
a fronteira
a pizarnikar
a leminskaria
& perlonguei
meus passos, girando
por calles muy concretas
(ay, bacacay!)
pois não
logrei medrar
claudicante el
receituário mágico
que en el barro comenzen
as metamorfoses
de ojos de
lynce, patas de
jabón digo ramón digo dragón
ou tigronas de gude
(oh! orugas de la col)
que me tele-
trans-
portas-
sem
a eras o países
imaginários
&
quedei
-me ali mesmo na
Rivadavia 4930
com o café frio
(três cubos de açúcar
no cálice a prova
de que existo)
sonhando
com a minha desova
completa


§

Nota:

§ - escrito em Buenos Aires, em maio de 2006, em um café da Avenida Rivadavia (o endereço no poema é o verdadeiro), com a poeta Angélica Freitas na cadeira à minha frente, e oralizado pela primeira vez no Festival de Poesia Latino-Americana da cidade, o Salida al Mar; publicado pela primeira vez no número de estréia da Modo de Usar & Co., em 2007


§

Entretenimento para as próprias entranhas


§- Sonhar com tragédias providências de uma noção qualquer de ápice



§- Dedo no controle remoto rebobine o aguilhão devolva filho e filho a Medéia ora medicá-la com três Jasões sobressalentes



§- Filha pródiga ou Antígona talvez


§- Ao retornar nas pontas dos pés de funerais encontra louros chave da cidade o direito a embalo em colo de rei Momo beijo na bochecha oh Creonte meu tio



§- No fosso ao som de Dolores Maysa Ângela Rô Rô em horror



§- Que beleza que beleza é essa que requer formulários preenchidos no terror eu quero surdas as legiões dos anjos



§- This is not the last song refrão irritado com a rotina



§- Nessa novela das 11 estepes são substantivos femininos masculinos



§- Aceitar o papel de figurante extra extensa área de interregno caracterizada pela ausência total de socorro



§- Resolução do trânsito que cresce floresce na época das chuvas épica das curvas



§- Play it again Sam abaixo a hemostasia



§- Prólogo episódio e êxodo



§- Sofrimento no prolongamento da coluna vertebral dos outros



§- Refrigério



§- Em debate no programa de hoje cara a cara Helena Hécuba



§- Prolixo blockbuster de êxito

§- Rimar orgasmo com ooblasto e no estafar da última das estrofes aborto



§- Canibal nenhum fornecerá silêncio às ovelhas Clarice



§- Quando o clímax é o ocaso e traga o dia



§- And the beat goes on / in the goat-song

(2009)


.
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quarta-feira, 22 de julho de 2009

Labores da semana

§- estou editando um vídeo novo e escrevendo seu texto, para minha performance no Espai d´Art Contemporani (Espaço de Arte Contemporânea) de Castelló, entre Barcelona e Valência, na sexta-feira da semana que vem. Fui convidado pelo Instituto para uma performance solo, de 40 minutos, apresentando meu trabalho em vídeo, sonoro e escrita. Para a performance na Catalunha dos meus avós, devo também apresentar duas novas colaborações com músicos de Berlim.

O vídeo/texto deverá se chamar "Date of manufacture" e lê, por enquanto:

Date of manufacture

to become or not to

become / the item

one is

supposed to / describe

specific aching

and etching

through the craft

of hands / from fluids

source of likeness

only to appreciate

the design

of the time

we share / with

fellow machines / for

whom expiring

is a verb

of action / oh skin

against mass

customization / aid

us while our intestines

question ownership

& predate

our fabrics and tissues

for our predators


Ricardo Domeneck, 2009.

Fará mais sentido, talvez, com o vídeo. Posto assim que o terminar.

§- atualizei a HILDA MAGAZINE: apresento o poema sonoro "On dissecting the larynx", do canadense W. Mark Sutherland. Conheci o poeta-performer em Madri, no ano passado, quando nos apresentamos juntos no festival de poesia experimental Yuxtaposiciones.

§- Traduzi o poema "Ich will das Brot mit den Irren teilen", da austríaca Christine Lavant (1915 - 1973) e o postei, com um pequeno artigo biográfico, na franquia eletrônica da Modo de Usar & Co.. Trecho do artigo:

"Sua poesia mística, com intenso tom religioso, é de difícil circulação nos países de língua alemã, território em que a maior parte dos poetas abandonou tal pesquisa poética. Em um período que viu a poesia austríaca, por exemplo, retomar certas estratégias das vanguardas germânicas, em especial a dos dadaístas de Zurique e Berlim, a poesia mística de Christine Lavant, baseada em um trabalho fortemente metafórico, acaba parecendo fora de sintonia com o seu período histórico. No entanto, poderíamos ver seu trabalho, como o de Ingeborg Bachmann ou mesmo o de Paul Celan (o inicial, pelo menos) e o de Rose Ausländer, como retomadas de certas pesquisas de expressionistas austríacos como Georg Trakl. São poetas que sabem muito bem que a escrita de uma poesia órfica custa algumas visitas ao Hades."

§- editei um excerto em vídeo do concerto de meu amigo Lucas Croon, na semana passada, na Berlin Hilton:


(Lucas Croon na Berlin Hilton, 15 de julho de 2009)

Hoje à noite, meu amigo Uli Buder, que se apresenta como Akia, faz um pequeno concerto.

sexta-feira, 17 de julho de 2009

"O anjo da reprise"

O anjo da reprise

Fé cega no informe
dos olhos os dedos
de Tomé
pela ferida do prego
distância bússola
e intransigência
do horizonte
pela cabeça
da mulher
de Ló talvez
apenas a certeza
de não
ser capaz do olvido:
o único inominável
é o long forgotten
ou cego de ciúmes
o medo de ter à cama
um monstro
define o que se troca
entre os olhares
de uma Psiquê
erotizada e um Eros
psicótico
no instante à vela
e agora
vejo-te em parte
e aguardo
sentado pelo relatório
de Medéia sobre a lição
de quem arrisca urrar
"meu reino
por um amante
"
já que nessa
novela não
veremos o rosto
de Jasão sem filhos
jazer em divórcio
sobre as folhas
enrodilhado
ou de joelhos
a barba de três dias
e o sol queimando
as unhas o quotidiano
longe dos olhos
ou o anjo
que volta o rosto
sempre à espera
das facas às costas

§

Ricardo Domeneck, Sons: Arranjo: Garganta, no prelo. Poema publicado pela primeira vez na edição de julho da revista Sala Grumo.

quarta-feira, 15 de julho de 2009

Os poetas da escassez

Publiquei hoje traduções para alguns poemas de Rose Ausländer (1901 - 1988) na Modo de Usar & Co.

A poeta nasceu em Czernowitz, na Bucovina, quando esta ainda pertencia ao Império Austro-Húngaro, mesma cidade de Paul Celan, 20 anos mais moço que Ausländer. Os dois se conheceram no gueto da cidade, quando suas famílias foram aí encerradas pelos nazistas, durante a ocupação da região, em 1941. Ausländer tinha 40 anos, Celan tinha 20. Ela descreveria mais tarde a forte impressão que lhe causara o poeta adolescente. Neste momento, ela havia publicado um único livro, intitulado Der Regenbogen (O arco-íris), em 1939, ainda fortemente influenciada por expressionistas germânicos como Trakl e também por Rilke, algo que compartilhava com Celan. Os dois estariam entre os poucos judeus sobreviventes da cidade, perdendo praticamente toda a família durante os extermínios. Ausländer sobreviveria aos últimos meses da guerra, escondida em um porão.

Ainda estás aqui

Lança teu medo
aos ares

Em breve
acaba teu tempo
em breve
cresce o céu
sob a grama
despencam teus sonhos
nenhures

Ainda
cheira o cravo
canta o melro
ainda tens um amante
e palavras para doar
ainda estás aqui

Sê o que és
Dá o que tens


--- Rose Ausländer, tradução minha.


A escassez, o parco, o mínimo, o sussurro são características comuns entre muitos dos poetas sobreviventes da catástrofe. Vemos isso em Rose Ausländer, assim como em Nelly Sachs; em muito da poesia de Paul Celan, que caminha em direção ao emudecimento; na poesia inicial de Edmond Jabès antes de entregar-se à tarefa hercúlea de resgatar a autoridade perdida d`O Livro; em Tadeusz Różewicz (Polônia), em Dan Pagis (Israel), em Miklós Radnóti (Hungria), em Raymond Federman (França). Nestes poetas, sentimos que o mínimo, o parco, o escasso não se apresentam por seguirem uma mera cartilha qualquer de qualidade literária, ditando o "conciso". Neles, o mínimo é uma necessidade intrínseca, est-É-tica. Faz, em minha opinião, uma grande diferença.

É claro que, no caso destes poetas, esta lucidez deu-se por causa de uma tragédia, da Grande Catástrofe. Para eles, o adágio tantas vezes repetido por John Cage em seus textos //// WE POSSESS NOTHING /// era uma verdade inescapável. A estes poetas, restavam apenas a voz e a linguagem. Quando Celan escreve sobre a voz e o canto dos prisioneiros nos campos de extermínio, naquele momento pungente do poema "Todesfugue", por exemplo, ele não está criando uma metáfora. A língua e seu arcabouço eram tudo o que restava a essas pessoas, deprivadas de tudo e todos. Abandonadas. Um dos grandes impactos do ciclo de filmes conhecido como Shoah, de Claude Lanzmann, está na potência desta história oral, contada pelos sobreviventes, que se inicia com um senhor, que um dia fora um menino de 13 anos, que cantava para os nazistas para sobreviver.

Essa est-é-tica da escassez pode ser sentida em outros poetas, que intuíram a catástrofe da existência humana em qualquer século, o fato de que::::: WE POSSESS NOTHING :::::::. Na poesia gnômica de Emily Dickinson, por exemplo. Aquela que escreveu: "If fame belonged to me, I could not escape her; if she did not, the longest day would pass me on the chase, and the approbation of my dog would forsake me then. My barefoot rank is better." Ainda entre norte-americanos, sentimos claramente esta tomada de posição est-É-tica em George Oppen e Lorine Niedecker. Usando algumas palavras do poema de exórdio da obra de Oppen, penso nesta poesia como "Of the world, weather-swept, with which / one shares the century."

The roots of words
Dim in the subways

There is madness in the number
Of the living
`A state of matter´

There is nobody here but us chickens

Anti-ontology

He wants to say
His life is real,
No one can say why

It is not easy to speak

A ferocious mumbling, in public
Of rootless speech


George Oppen, no livro Of Being Numerous, 1968.

Essa es-É-tica pode, no entanto, assumir sua funcionalidade nas mais variadas formas. Em Henri Chopin, ela ditava o abandono por vezes completo da palavra, e a adoção da prática de uma poética da respiração, em que o material do poeta torna-se seu próprio corpo.

Henri Chopin - "La civilisation du papier"

No Brasil, estou certo de que a magreza de João Cabral de Melo Neto era ditada pela mesma necessidade est-É-tica intrínseca. Uma poética contra a usura, contra o desperdício. Algo que sublinha até o aparentemente desmedido Ezra Pound. Poemas como "A educação pela pedra" ou "A palo seco" são claras decisoes pela tomada de posição de uma est-É-tica. O que sussurra detrás destes poemas é um :::: WE POSSESS NOTHING :::::.

Como naquela mulher tão digna, que atendia pelo nome de Orides Fontela, a poeta à beira da indigência, uma de minhas guias est-É-ticas. Como esta mulher poderia nos dar exuberâncias superficiais, barroquismos de cosmética? Ela era guiada por uma est-É-tica do parco, que se exalava de sua vida parca e pobre. Em um pequeno ensaio sobre a sua poesia, escrevi que isso funciona "como se a poesia de Orides Fontela não se decidisse de forma definitiva entre a destruição do mundo por uma força centrípeta ou centrífuga. Seus poemas têm, em minha opinião, apesar da superfície polida de cristal, uma violência sem muitos paralelos na poesia do pós-guerra no Brasil. O mesmo tormento possa talvez ser sentido na prosa de Hilda Hilst, mas nesta outra mística a solução era o escárnio e a exuberância do dilúvio, enquanto, em Orides Fontela, o desértico daquele que jamais possuiu coisa alguma era preferível."

Clima

Neste lugar marcado: campo onde
uma árvore única
se alteia

e o alongado
gesto
absorvendo
todo o silêncio - ascende e
.............................imobiliza-se

(som antes da voz
pré-vivo
ou além da voz
e vida)

neste lugar marcado: campo
........................................imoto
segredo cio cisma
o ser
celebra-se

- mudo eucalipto
...elástico
...e elíptico.



Entre os poetas brasileiros vivos, sinto essa mesma necessidade intrínseca em Ronaldo Brito, um poeta de quem precisamos reeditar a obra com urgência. Seu livro Asmas, de 1982, foi um dos pontos luminosos daquela década, assim como Alba, de Orides Fontela. Que a década perdida dos yuppies tenha abarcado estes dois livros traz-me esperança.


Fala a palavra
ignara
diz o isto
do nada
poema mudo
com critério de sono
cala a fonte
funda
o branco no papel
sem fundo
e asma, asma


Ronaldo Brito, no livro Asmas (1982).


Quando leio o axioma de qualidade que dita concisão, tão pregado na década de 90, concordo, mas sondando a lucidez de não me esquecer que

WE POSSESS NOTHING

WE POSSESS NOTHING

WE POSSESS NOTHING

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sábado, 11 de julho de 2009

Poemas inéditos na revista eletrônica Sala Grumo

A edição de julho da revista eletrônica Sala Grumo (Argentina/Brasil) acaba de subir aos ares da rede, com alguns poemas inéditos meus. Um dos textos, "O anjo da reprise", estará no meu terceiro livro, Sons: Arranjo: Garganta, que está no prelo.

Os outros textos:

"Poema (para Jonas Lieder)"
"Texto em que o poeta medita sobre certas leis da física / e busca convencer-se a si e ao amante que a dor alheia / é irreproduzível e a própria irremediável"
e os 4 poemas do "Ciclo do amante substituível"


são mais recentes e fazem parte de um outro livro em que venho trabalhando, que provavelmente chamarei de phono grama para logo tipo. Estes poemas mais recentes mostram, de certa forma, a direção do meu trabalho no momento.

É possível acessar a página da Sala Grumo AAQQUUII.

Digo aqui meu Obrigado ao poeta argentino Mário Camara pelo convite.

quinta-feira, 9 de julho de 2009

"A educação dos cívicos sentidos" (work in progress)

Este é um trabalho em andamento, o tal de work in progress. Preparei-o para ser apresentado na abertura da FLAP 2009, na Casa das Rosas, na terça-feira, 7 de julho. O convite veio de Rafael Daud, um dos organizadores. Primeiramente, consideramos uma vídeo-conferência, em que eu apresentaria um texto em São Paulo, estando em Berlim. Uma das muitas vantagens da era digital. No entanto, não se trataria propriamente de um debate, mas de uma mesa em que os poetas Alfredo Fressia (Uruguai), Paulo Ferraz (Brasil) e eu apresentaríamos uma fala a partir do poema de W.B. Yeats: "On being asked for a war poem" (1919). Por isso, após discutirmos problemas técnicos de conexão na Casa das Rosas e um incômodo fuso-horário de 5 horas (que me obrigaria a discutir poesia e política às 2 da manhã em Berlim), decidi que faria mais sentido apresentar uma intervenção em vídeo. O resultado apressado foi este aqui, abaixo. Talvez não devesse estar mostrando um trabalho ainda inacabado, mas ele foi apresentado na Casa das Rosas e o mostro aqui como registro. Pretendo voltar a ele, regravar o vídeo e o som com melhor qualidade, repensar a melhor apresentação. Comentários críticos são mais que bem-vindos. Segue minha oralização em vídeo e o texto escrito.


§




A educação dos cívicos sentidos (texto em vídeo)
Ricardo Domeneck



Aos vinte anos da queda do muro, a oportunidade de meditar sobre dualismos que ainda imperam? Num momento que se gaba de suas multiplicidades? Essa queda marca a ascensão do Império sob o qual nos movimentamos hoje? Opera esse Império através da língua do poema de Yeats? "On being asked for a war poem"? O poeta que escreveu "I think it better that in times like these / A poet keep his mouth shut" é o mesmo que escreveu "Easter, 1916"? Ou este poeta acreditava que a política pertence aos políticos, não aos poetas, e por isso se fez senador? O papel do poeta seria mesmo o de emocionar moçoilas e consolar velhinhos? O silêncio proposto por Yeats é o mesmo de Clarice Lispector que, em lhe sendo pedido o papel do escritor brasileiro, respondeu: "falar o menos possível"? O silêncio dos dois equipara-se ao de George Oppen? Aquele que parecia também crer que poesia e política são incompatíveis? É isso o que dizia a personagem de Glauber Rocha em Terra em Transe? A poesia e a política são demais para um único ser humano? É por isso que Oppen abandona a poesia por vinte anos para dedicar-se ao ativismo político? Ninguém aqui, além de nós, as galinhas? O poeta está ofendido? O poeta é inofensivo? Você teria coragem de dizer isso a Ossip Mandelshtam, que morreu na Sibéria por causa de um poema? Você é pós-utópico? Se o é, você é também trans-histórico? Que dia é hoje no seu poema? Você também acredita que a vanguarda foi apenas um afrodisíaco para a tradição? Escrever sonetos ou concretos tem implicações políticas? Política é conteúdo ou política é forma? Essa pergunta é a mesma se mudarmos o substantivo "política" pelo substantivo "poética"? Talvez a ética da escrita configure-se nesta resposta? Mais radical o silêncio ativista de George Oppen ou o ativismo em voz alta de Ulrike Meinhof? Também te perturba imaginar esta escritora pacifista tornando-se uma das líderes da Facção do Exército Vermelho? O que leva um poeta a decidir que palavras não bastam? O que leva uns a recorrerem a poemas (como Murilo Mendes), uns ao Senado (como W.B. Yeats), outros à organização de greves (como George Oppen) e outros ainda à luta armada (como Ulrike Meinhof)? A poesia silencia diante do mundo dos eventos? Poesia pura é ativismo e resistência? O que diabos queria dizer Adorno com a impossibilidade de escrever poesia após Auschwitz? Você esteve em Búzios hoje? Você já saqueou Celan esta semana? Insistir na inutilidade da poesia como única forma de resistência? Poesia resistência? A negação do caos presente pela nostalgia da Idade de Ouro de um passado mitificado? Ou a negação do caos presente pela invocação da parúsia, da revolução? Resistência pela negação e não-participação, como queria Theodor Adorno no ensaio “Lírica e sociedade”? Lorca foi mesmo assassinado como poeta lírico, ou foi o dramaturgo dissidente e inimigo dos valores de direita que os fascistas precisaram silenciar? Há diferença entre o Lorca do Romanceiro Gitano e o Lorca de A Casa de Bernarda Alba? Você simpatiza com a revolução? Você está sendo filmado? Você já confundiu o espaço público com seu espaço privado hoje? Vladimir Maiakóvski encontra Ezra Pound contra a usura? Oh 1930s, with Usura hath no man a house of good stone? Oh 1960s, with Capitalism hath no man a house? Oh 2000s, with Globalization hath no man a no? O que Ludwig Wittgenstein queria realmente dizer ao afirmar que ética e estética são uma só? Quando um poeta levanta-se da cama pela manhã, ele reencena diariamente o “salto participante” proposto por Décio Pignatari? À direita ou à esquerda, de que lado está o poeta, e isto define se é político ou não? Estava sendo político o cavalier Richard Lovelace ao escrever o poema lírico “To Althea, from Prison”? Como Tomás Antônio Gonzaga escrevendo a segunda parte de “Marília de Dirceu” na prisão? Ou são mais políticas as Cartas Chilenas? Oh Shelley, ninguém quer reconhecer tua legislação mundial? Quem inaugurou o poeta-Cassandra? “L`Albatros” himself, Baudelaire? Rimbaud, o desajustado? O adolescente loiro? O amante de Verlaine? O contrabandista de armas na África? É mais político oralizar estas perguntas ou publicá-las em escrita? Em que momento o poeta exila-se ou é expulso da República? Em que momento o poeta épico deixa de fundar a nação para fundi-la e findá-la? O planalto central do Brasil desce em escarpas abruptas? Você gostaria de ser o Maudsley dos nossos crimes nacionais? Te aborrece tudo quanto seja público? Você estampa teu miocárdio privado em cada muro público? Gregório de Matos entoando “Triste Bahia! Ó quão dessemelhante / Estás e estou do nosso antigo estado!”? Ou seu racismo na estrofe seguinte anula o ato? Tristan Tzara, Hans Arp e Hugo Ball entoando DADA em atas estavam uivando pela utopia ou destoando da distopia? A política do poeta está no questionamento formal? Ou seria melhor discutir os suportes para a poesia, como métodos de publicação e distribuição e financiamento? Tudo isso tem implicações, como querem os poetas da revista L=A=N=G=U=A=G=E? Onde te ocultas, precária síntese, penhor do meu sono, luz dormindo acesa na varanda? Poeta bom é poeta morto? Poeta bom é poeta universal? Ou mulher escreve como mulher, viado como viado, negro como negro, macho como macho? Você é um poeta aristocrático? Que ação nos é possível? Mas, ora, escrever poesia já não é ativismo e resistência? The poet cannot set a statesman right mas pode dificultar-lhe os abusos? Você já leu os jornais hoje? Você traduz "news that stays news" por "novidade que permanece novidade" ou "notícia que permanece notícia"? O caminho da sátira é o único para uma poesia abertamente política? Será tudo culpa do nosso vocabulário ou será tudo culpa de Kate Moss? Podemos aprender com a sutileza política de Machado de Assis e Clarice Lispector? Podemos parafrasear Lispector e dizer: eis que o poeta está feliz, pois finalmente desiludiu-se? Se vivemos um momento pós-utópico, tanto melhor? Vamos começar a escrever uma poesia pré-distópica?

§

A FLAP segue durante a semana. Confira a programação no blog de Dirceu Villa, que participa de vários eventos, AAQUUII.

segunda-feira, 6 de julho de 2009

Tetine com Mula em anexo

Publiquei hoje, na franquia eletrônica da Modo de Usar & Co., um artigo sobre o duo paulistano/londrino Tetine, formado por Eliete Mejorado e Bruno Verner, com a postagem de alguns de seus trabalhos em música-vídeo e performance oral. Você pode visitá-la AAQQUUII.

Descobri o trabalho do Tetine quando eles lançaram o álbum/espetáculo "Música de amor", em 1999. Lembro-me de ouvir este álbum repetidas vezes nos dois anos seguintes. Lembro-me também de usar sempre uma citação da faixa-título do álbum "Alexander´s Grave" (1996), o primeiro do Tetine, em que Eliete Mejorado diz "Do you think I have no pride just because I have no shame?"... ainda é uma das minhas frases favoritas, assim como às vezes, out of the blue, sinto vontade de dizer: "According to the latest theories, Time is simply a useful tool and dimensional construct for organizing realities / So in 1987 I got a job as a tourist guide", no poema sonoro "Russian Roulette". Eu amo a non sequitur que gera o poético nestas linhas.

Trombava com eles no subterrâneo de São Paulo, em festas e performances, mas fui conhecê-los pessoalmente apenas em 2006, quando eles já viviam em Londres e eu em Berlim. Sabendo que eles estariam aqui no Berlimbo para uma performance no teatro Hebbel am Ufer, escrevi-lhes perguntando se eles gostariam de ficar alguns dias mais na cidade, para fazerem uma outra performance no nosso evento-intervenção semanal Berlin Hilton, our own private Cabaret Voltaire. Nosso relacionamento artístico e de amizade data deste momento. Desde então, já nos apresentamos juntos em Londres, criei com amigos o selo Kute Bash Records apenas para relançar em vinil seu "L.I.C.K. My Favela" e colaboramos no poema "Mula", texto meu que eles oralizaram e musicaram em 2007. Segue abaixo o poema, em vocalização do Tetine e vídeo de Eugen Braeunig:


(Tetine & Ricardo Domeneck, com vídeo de Eugen Braeunig, 2007)

§

Mula


..............Minha
senhora: os unicórnios
que caem com a raiz
não
voltam mais; ainda
que van-goghs até
que engasgues,
.......sigo mula
a indiciar o caso
excepcional
do sem espécie,
self-archived tool, exílio
............dos catálogos
a especificar o espaço
para a porcentagem da escolha
do puro, alheia que se agita
antes de abrir, dose cavalar
de juramento e
egüidade. Poupa-me,
Popeye: longe de mim
impor-me híbrida
à tua hípica -
brutalmente homogênea,
especialista em fronteiras,
.......eject de habitat,
eis-me, excelentíssimo,
a de cascos
.......não-retornáveis,
nula nulla
tal qual high bred hybrid
relinchando o já morto:
muslos de mulícia,
esterilizável, aureolar,
............multívaga
....... ambiqüestre
....de mulas prontas,
perdoai vossa serva
preguiçodáctila aos berros
perturbando vosso áureo
piquenique do sublime,
.......illicit mule
espirrando em vosso épico.
............Não
há Blade
Runner que resista
mesmo euzim
..............fake mullah,
insciente dos teus métodos,
ó sussurrável, hoof muffler
da palha de meu estofo.
Prometo-me estóica
.........e subcutânea,
bem fazes em esporear-me
o couro catecúmeno à chuva
do teu cuspe, inestimável
senhor de eco intumescido:
.......até que a mula
.......aqui fale
como manda
o figurino,
e encontre a exit
de quem às caras
me dera lamber o mundo
com a própria língua: mulo
fundindo
.......com a função da forma
os extremos do exorcício e
a fanfarra do sem categoria.


Ricardo Domeneck
Berlim – agosto mês de desgosto, 2007

§

Conduzi esta entrevista com eles em Londres, em 2006, postada mais tarde na revista eletrônica FLASHER, que eu editava naquela época.



§

Você pode saber mais sobre o Tetine AAQQUUII.

domingo, 5 de julho de 2009

Sábados e domingos

Brindei-me ontem com a oportunidade de estar presente à leitura e debate de Rosmarie Waldrop na Akademie der Künste, durante o Festival de Poesia de Berlim, tendo a chance de finalmente conhecê-la pessoalmente. O trabalho de Waldrop teve um impacto muito grande sobre minha est-É-tica, desde que a descobri no livro Lawn of Excluded Middle, que você pode ler AAQQUUII. Desde então, leio tudo o que encontro, como o maravilhoso Reproduction of Profiles (NY: New Directions, 1987), o Reluctant Gravities (NY: New Directions, 1999) e aquele que comprei ontem no festival e passei o dia lendo: Blindsight (NY: New Directions, 2004). Ela tem sido muito generosa comigo desde que, cheio de temor e respeito, primeiro a contactei, trocando alguns textos, e permitindo-me publicar sua tradução para poemas de Ulf Stolterfoht em minha Hilda Magazine. Tive a honra de ter minha série "Six Songs of Causality" publicada ao lado de poemas seus na revista eletrônica Green Integer Review, editada por Douglas Messerli, em 2007. Tenho traduzido seus poemas e trabalho no momento em seu texto "Thinking of follows", para o segundo número impresso da Modo de Usar & Co.. Considero-a um dos mais importantes poetas vivos da língua inglesa.

A leitura foi, infelizmente, bastante curta. Na verdade, tratava-se de um debate sobre e entre poetas que emigram e assumem um novo país, um novo contexto, uma nova língua. Para isso, Rosmarie Waldrop, que nasceu na Alemanha em 1935 e emigrou para os Estados Unidos com 23 anos, leu capítulos de seu livro A Key Into the Language of America (NY: New Directions, 1994), traduzido para o alemão pela poeta Elke Erb e publicado por aqui em edição bilíngue. No livro, Waldrop descreve o processo de imersão em uma nova lingua e cultura, tomando como base o trabalho homônimo de Roger Williams (1603 - 1683), o primeiro estudo em inglês de uma língua e cultura indígenas, da tribo Narragansett, que fala a língua conhecida como Algonquin. Você pode ouvir Rosmarie Waldrop lendo trechos deste livro AAQQUUII. Do debate e da leitura também participou o jovem poeta americano Christian Hawkey (n. 1969), que vive há anos entre Nova Iorque e Berlim, junto de seu tradutor para o alemão, o poeta Steffen Popp (n. 1978). Tudo fez parte do USA Day no festival, promovido pela Embaixada Americana no 4 de julho.


(Christian Hawkey lê alguns de seus poemas)

Após jantar com amigos na própria Akademie der Künste (Academia das artes), entramos todos para a performance de Edwin Torres e Saul Williams. Escrevo a respeito em um outro momento. Ainda estou digerindo a coisa toda.


(Edwin Torres em performance)

Hoje à noite, discoteco no encerramento do Festival.

sexta-feira, 3 de julho de 2009

Dimitri Rebello e a canção que me salvou o oxigênio numa manhã de chuva em São Paulo


(Dimitri BR, "Mercado Negro", pague seus pecados / ou então culpe a sorte [para ricardo domeneck e rafael mantovani])


Meu querido Dimitri, segue sendo um dos seus melhores poemas. As lembranças inundaram, como a chuva daquela manhã em São Paulo. Vou ouvir isso sem parar nos próximos dias. A canção está aqui, não é porque você ma dedicou, mas porque você sabe a importância que ela tem para mim, ela me ajudou muito naquele momento delirante por que passava quando você a tocou e cantou pela primeira vez. Assim como o poema da holotúria, da Wislawa Szymborska, mostrou-me o caminho fora da catástrofe; assim como os versos do Creeley: "let light / as air / be relief" foram mantra por alguns meses; essa canção salvou-me o oxigênio nas guelras naquela manhã de chuva, num canto de São Paulo. Quando penso em você, lembro-me sempre e ainda e ainda e sempre daquela noite em que caminhávamos para a sua casa, conversando, quando fomos assaltados e tudo o que você tinha no bolso era o livro Encontro às cegas, da nossa querida Marília (Garcia), e o assaltante o arrancou do seu bolso e você gritou "Devolve isso já, cara!" e o rapaz mal sabia o que fazer com aquilo, um livro de poemas (!!!) e o devolveu, sem jeito, quase pedindo desculpas por tentar nos assaltar, e nós seguimos conversando, como se nenhuma faca pudesse ter cortado pele alguma naquela noite.

§

Para quem não conhece o trabalho de DIMITRI BR, acompanhe seu projeto DIAHUM, em que apresenta uma video-canção original no dia 1 de cada mês.

quarta-feira, 1 de julho de 2009

De heróis e aniversários



Comemoro este fim-de-semana, no dia 4 de julho, meus 32 invernos (mais um ou outro que acumulei ao perambular entre os hemisférios). Usei a ocasião este ano para convidar um de meus heróis alemães para uma performance e intervenção na Berlin Hilton, o evento que co-organizo às quartas-feiras aqui no Berlimbo, our own private Cabaret Voltaire. Em anos anteriores, convidei, por exemplo, a maravilhosa Janine Rostron, conhecida como Planningtorock, assim como Kevin Blechdom.

Hoje à noite, apresenta-se Wolfgang Müller, um dos membros fundadores do coletivo berlinense Die Tödliche Doris (algo como A Doris Letal), que esteve em atividade entre 1980 - 1987. Alguns talvez conheçam uma ou outra canção da Tödliche Doris, por covers, como a famosa "Tanz im Quadrat", gravada pelo Stereo Total.


(Die Tödliche Doris, "Tanz im Quadrat")

Die Tödliche Doris foi uma das mais conhecidas e revolucionárias bandas, ao lado do Einsturzende Neubauten e do grupo Malaria!, daquilo que ficou conhecido por muitos nomes: Neue Deutsche Welle (Nova Onda Alemã, a versão germânica do New Wave), post-punk, industrial ou, como eles preferiam chamar-se, os Geniale Dilletanten, título de um livro de Wolfgang Müller.


(Die Tödliche Doris, "Küchenmusik & Schuldstruktur")

No entanto, o grupo foi aquele que mais claramente buscou borrar as fronteiras entre gêneros em sua prática artística: Die Tödliche Doris fez música, vídeos e filmes em Super-8, instalaçoes, happenings. Sua influência foi marcante, ainda que subterrânea. Em 1983, o grupo participa da Bienal de Paris. Ali, Die Tödliche Doris apresenta seu trabalho visual "Die Photomatonreparateur" (O reparador de cabines fotográficas), em que colecionam fotos de estranhos feitas em cabines fotográficas, muito conhecidas em Berlim, mas apenas aquelas fotos que as pessoas jogavam fora, encontrando entre elas, com frequência, a de um mesmo homem, que eles viriam mais tarde a descobrir que era do reparador das cabines. Sim, você adivinhou: Jean-Pierre Jeunet "roubaria" esta idéia mais tarde para a personagem de Matthieu Kassovitz em Le fabuleux destin d'Amélie Poulain (2001).

Performances incluem o Museum of Modern Art (MoMA), de Nova Iorque, e o Musée d'Art Moderne, em Paris. Em 1987, Die Tödliche Doris participa da documenta 8, em Kassel, antes de dissolver a banda em... vinho. Aqui, a banda joga com o conceito de "auflösen", dissolver-se, expressão usada tanto para o momento em que as uvas tornam-se vinho, como quando os membros de uma banda decidem não mais trabalhar juntos, e literalmente cria seu último trabalho: o vinho Die Tödliche Doris, no qual a banda dissolve-se.

É uma honra ter Wolfgang Müller na Berlin Hilton hoje à noite. Mais sobre Die Tödliche Doris: AAQQUUII e AAQQUUII.

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