Assisti este fim-de-semana ao documentário em animação do israelense Ari Folman, chamado Valsa com Bashir (2008). Talvez seja a melhor animação que tenha visto, minha preferida, pelo menos. Centrada na invasão do Líbano por Israel em 1982, após o assassinato de Bashir Gemayel, o presidente eleito e líder das Falanges Libanesas, o diretor Ari Folman, que estava entre as Forças de Defesa de Israel a invadirem Beirute em setembro de 1982, passa a entrevistar ex-colegas para descobrir onde estava na noite dos massacres nos campos de refugiados palestinos, chamados Sabra e Shatila, perpetrados pelos falangistas cristãos, como vingança contra o assassinato de Bashir Gemayel, com a anuência do Governo de Israel.
A escolha estética de apresentar tal história como filme de animação pode parecer questionável, mas acabou sendo extremamente "eficiente", para mim, sem tirar a força do filme. Entre os entrevistados por Folman está o jornalista Ron Ben-Yishai, o primeiro a entrar nos campos após o massacre. O filme gerou em mim a sensação física de ocupação de espaço histórico antes de desconhecido em minha mente. Poucas vezes tive esta sensação de "acréscimo épico". Guardadas as devidas proporções e sem ignorar as óbvias diferenças estéticas, lembro-me de sentir esta mesma tristeza histórica ("an epic is a poem including History", Pound dixit) apenas ao ler Os Sertões e alguns outros poucos trabalhos.
A Guerra do Líbano está entre as minhas "memórias históricas" mais antigas como criança. Eu tinha 5 anos quando os eventos do filme ocorreram, morava em Bebedouro, no interior de São Paulo. Mas lembro-me de estar na sala, com meus pais, enquanto notícias sobre a Guerra chegavam pela televisão. Lembro-me da sensação estranha de descobrir, como criança, a existência de algo chamado de "guerra". Era como se a Guerra do Líbano fosse eterna, tivesse sempre existido e sempre existiria. Quando penso em minhas memórias mais antigas como criança, reportagens sobre a Guerra do Líbano e discursos do General João Figueiredo na televisão pairam como "memórias" de um tempo em que eu aos poucos descobria, aos 5 anos, que a sala, os quartos e cozinha de minha casa não eram o mundo. E que havia coisas assustadoras da porta para fora. Talvez já houvesse o medo da morte.
segunda-feira, 27 de abril de 2009
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Mais ou menos de mim
Projetos Paralelos
Leituras de companheiros
- Adelaide Ivánova
- Adriana Lisboa
- Alejandro Albarrán
- Alexandra Lucas Coelho
- Amalia Gieschen
- Amina Arraf (Gay Girl in Damascus)
- Ana Porrúa
- Analogue Magazine
- André Costa
- André Simões (traduções de poetas árabes)
- Angaangaq Angakkorsuaq
- Angélica Freitas
- Ann Cotten
- Anna Hjalmarsson
- Antoine Wauters
- António Gregório (Café Centralíssimo)
- Antônio Xerxenesky
- Aníbal Cristobo
- Arkitip Magazine
- Art In America Magazine
- Baga Defente
- Boris Crack
- Breno Rotatori
- Brian Kenny (blog)
- Brian Kenny (website)
- Bruno Brum
- Bruno de Abreu
- Caco Ishak
- Carlito Azevedo
- Carlos Andrea
- Cecilia Cavalieri
- Cory Arcangel
- Craig Brown (Common Dreams)
- Cristian De Nápoli
- Cultura e barbárie
- Cus de Judas (Nuno Monteiro)
- Damien Spleeters
- Daniel Saldaña París
- Daniel von Schubhausen
- Dennis Cooper
- Dimitri Rebello
- Dirceu Villa
- Djoh Wakabara
- Dorothee Lang
- Douglas Diegues
- Douglas Messerli
- Dummy Magazine
- Eduard Escoffet
- Erico Nogueira
- Eugen Braeunig
- Ezequiel Zaidenwerg
- Fabiano Calixto
- Felipe Gutierrez
- Florian Puehs
- Flávia Cera
- Franklin Alves Dassie
- Freunde von Freunden
- Gabriel Pardal
- Girl Friday
- Gláucia Machado
- Gorilla vs. Bear
- Guilherme Semionato
- Heinz Peter Knes
- Hilda Magazine
- Homopunk
- Hugo Albuquerque
- Hugo Milhanas Machado
- Héctor Hernández Montecinos
- Idelber Avelar
- Isabel Löfgren
- Ismar Tirelli Neto
- Jan Wanggaard
- Jana Rosa
- Janaina Tschäpe
- Janine Rostron aka Planningtorock
- Jay Bernard
- Jeremy Kost
- Jerome Rothenberg
- Jill Magi
- Joca Reiners Terron
- John Perreault
- Jonas Lieder
- Jonathan William Anderson
- Joseph Ashworth
- Joseph Massey
- José Geraldo (Paranax)
- João Filho
- Juliana Amato
- Juliana Bratfisch
- Juliana Krapp
- Julián Axat
- Jörg Piringer
- K. Silem Mohammad
- Katja Hentschel
- Kenneth Goldsmith
- Kátia Borges
- Leila Peacock
- Lenka Clayton
- Leo Gonçalves
- Leonardo Martinelli
- Lucía Bianco
- Luiz Coelho
- Lúcia Delorme
- Made in Brazil
- Maicknuclear de los Santos Angeles
- Mairéad Byrne
- Marcelo Krasilcic
- Marcelo Noah
- Marcelo Sahea
- Marcos Tamamati
- Marcus Fabiano Gonçalves
- Mariana Botelho
- Marius Funk
- Marjorie Perloff
- Marley Kate
- Marília Garcia
- Matt Coupe
- Miguel Angel Petrecca
- Monika Rinck
- Mário Sagayama
- Más Poesía Menos Policía
- N + 1 Magazine
- New Wave Vomit
- Niklas Goldbach
- Nikolai Szymanski
- Nora Fortunato
- Nora Gomringer
- Odile Kennel
- Ofir Feldman
- Oliver Krueger
- Ondas Literárias - Andréa Catrópa
- Pablo Gonçalo
- Pablo León de la Barra
- Paper Cities
- Patrícia Lino
- Paul Legault
- Paula Ilabaca
- Paulo Raviere
- Pitchfork Media
- Platform Magazine
- Priscila Lopes
- Priscila Manhães
- Pádua Fernandes
- Rafael Mantovani
- Raymond Federman
- Reuben da Cunha Rocha
- Ricardo Aleixo
- Ricardo Silveira
- Rodrigo Damasceno
- Rodrigo Pinheiro
- Ron Silliman
- Ronaldo Bressane
- Ronaldo Robson
- Roxana Crisólogo
- Rui Manuel Amaral
- Ryan Kwanten
- Sandra Santana
- Sandro Ornellas
- Sascha Ring aka Apparat
- Sergio Ernesto Rios
- Sil (Exausta)
- Slava Mogutin
- Steve Roggenbuck
- Sylvia Beirute
- Synthetic Aesthetics
- Tazio Zambi
- Tetine
- The L Magazine
- The New York Review of Books
- Thiago Cestari
- This Long Century
- Thurston Moore
- Timo Berger
- Tom Beckett
- Tom Sutpen (If Charlie Parker Was a Gunslinger, There'd Be a Whole Lot of Dead Copycats)
- Trabalhar Cansa - Blogue de Poesia
- Tracie Morris
- Tô gato?
- Uma Música Por Dia (Guilherme Semionato)
- Urbano Erbiste
- Victor Heringer
- Victor Oliveira Mateus
- Walter Gam
- We Live Young, by Nirrimi Hakanson
- Whisper
- Wir Caetano
- Wladimir Cazé
- Yang Shaobin
- Yanko González
- You Are An Object
- Zane Lowe
Arquivo do blog
-
▼
2009
(149)
-
▼
abril
(13)
- O que é est-É-tica
- Valsa com Bashir
- Hoje à noite, no Berlimbo, uma de minhas musas: Ja...
- Movimento em prol de poetas que saibam dançar
- Dos aniversários, dos feriados
- Táticas sensatas contra a dissipação de hormônios
- Saindo da caverna
- Angélica Freitas em cores
- Berlin, Berlim
- Escrever o corpo: poema (quase) inédito + "como ve...
- Se em São Paulo, quando em Berlim
- A fase azul de Derek Jarman
- Uli Buder : AKIA
-
▼
abril
(13)
Um comentário:
Eu estava num festival de animação em Bucareste quando vi o trailler de Valsa com Bashir. Fiquei alucinado. Achei que ia demorar séculos para passar no Brasil. Mas não. Chegou relativamente rápido. Mas foi decepcionante. Tipo ver Shortbus. Mentira. Shortbus incomparavelmente ruim.
Mulher, achei Valsa com Bashir bem fraquinho. Por razões estéticas e por razões políticas - mas só vou me ater às últimas, porque as primeiras me dão preguiça.
O diretor "pega leve" com os israelenses. Mostra esse soldado psicologicamente torturado (que é ele mesmo, mais jovem), o jornalista israelense indignado com o que a indiferença do Sharon (sendo que o Sharon fez muito mais do que lavar as mãos nesse caso), e, durante o massacre, o exército deles assiste, impotente, os assassinatos em massa que as falanges cometeram contra os refugiados palestinos. Por que não mostrar quem armou os libaneses cristãos, por exemplo? (Dica: é um pessoal que mora no Oriente Médio, não é árabe e não crê em Alá.)
Claro que o roteiro é do cara e ele pode escolher colocar o que quiser no filme. E claro que eu, como espectador, posso achar que as escolhas do cara mostram que ele, no fundo, é um reacionário querendo pagar de bonzinho- obrigado-a-compactuar.
E nem fudendo, nem fudendo mesmo que esse filme é uma animação melhor do que A Viagem de Chihiro ou do que Persépolis. Ou Shrek 2.
Postar um comentário