
§ A indeterminação das estações. A sensação (e subseqüente medo) de pertencer à periferia gerando a sede por inovação. Os debates internos exigindo o entrincheiramento de partidos opostos, divididos entre o positivismo das instituições políticas, controladas por uma elite que ainda anseia pelo Norte, e o misticismo das misturas de contextos lingüísticos e religiosos de partes distintas do globo. Porém, as investigações de uma identidade nacional sempre espelhadas em conceitos de homogeneidade cozidos na Europa, onde tais noções de nacionalidade unitária e monolítica são igualmente fictícias, ainda sofrendo e impondo a tentação do homogêneo.
§ As tendências em experimentação artística no território conhecido como Brasil têm se mostrado, freqüentemente, à direção de borrar fronteiras e aterrar trincheiras, onde artistas sempre tiveram que se manter atentos às separações: entre classes, entre sexos, entre raças. Borrar fronteiras, aterro de trincheiras. Se a denúncia da falsidade do mito de Gilberto Freyre para uma democracia racial tornou-se claramente necessária, nunca foi mais inexeqüível a urgência da luta por sua conquista. Assim, em um país onde o conceito de miscigenação foi eleito pelo modernismo como mito fundador, e onde a única trilha possível para artistas em uma sociedade dividida tornou-se a guerrilha pelo colapso de dicotomias como cultura erudita e popular, o conceito de Pop jamais mostrou-se essencial: esta já era a inclinação natural, muito antes dos anos 60.
§ Por instinto ou não, a escolha de resistência vinda da arte no Brasil foi o caminho de resistência interna. Se Adorno via a recusa da realidade e fuga ao sublime lírico como forma de revolta política, que expulsaria do trabalho artístico tudo o que o artista considera detestável na realidade em redor, podemos contemplar também, nos últimos cem anos, a escolha proposta, entre outros, pelos dadaístas: a estratégia de guerrilha cultural, sabotagem de sistemas, arte como vírus, que somente mostra-se eficiente dentro do organismo. Como a banda Secos e Molhados cantou nos anos 70: "E no centro da própria engrenagem / Inventa a contra-mole que resiste". Para artistas vindos de áreas como a América Latina, onde são constantemente obrigados a enfrentar a questão de identidade (ilusão de centro vendida por ideologias políticas européias, onde já causaram tanto derramamento de sangue, e mesmo assim comprada por nosso modernismo), isto apenas traz novas responsabilidades. Mas, enquanto na Europa a consciência política exige o expurgar de nacionalismos, na América Latina este mesmo nacionalismo é decretado obrigação política para os conscientes da posição econômica e social do continente no mundo, e a opressão que se sente vir do Norte.
§ Estes, os dilemas. Do manifesto modernista de Oswald de Andrade (Tupy or not tupy that is the question), declarando a morte de um padre português por indígenas e sua assimilação pelo ritual antropofágico como o ritual de nascimento da nação, apesar do anti-épico de Euclides da Cunha, à releitura de Pablo León de
§ O trabalho de um punk tropical permanece o de borrar fronteiras, aterrar trincheiras.