sexta-feira, 4 de março de 2011

Alguns poemas memoráveis da última década: "Miscasting", de Hilda Machado

Sigo aqui com minha série de artigos sobre poetas da década passada, a partir dos textos que me pareceram mais memoráveis dentre os que tive a sorte e alegria de ler, publicados entre 2001 e 2010. Após escrever sobre "sereia a sério", de Angélica Freitas, dedico o artigo a seguir à discussão do poema "Miscasting", de Hilda Machado (1952 - 2007), tragicamente não mais entre nós.


Alguns poemas memoráveis da última década: "Miscasting", de Hilda Machado
ou "Poesia funcional e formalmente útil para as futuras calamidades do leitor"


Dentre os luminosos conselhos e proposições estéticas de Ezra Pound, seja para seus pares contemporâneos ou para os poetas do futuro, muitas circulam hoje pelo Brasil, mas tão descontextualizadas e desfiguradas que se tornaram mais empecilhos que incentivos à produção de uma poesia que possa ter qualquer papel relevante em sua comunidade, a de seres que não só leem, mas também falam. O problema está, é claro, com alguns dos leitores de Pound e não com as proposições do americano, ou pior, na verdade com aqueles que muitas vezes as repetem sem realmente conhecerem os ensaios e o contexto histórico e estético em que surgiram.

É necessário também dizer, no entanto, que alguns deles facilitam essa falsificação por sua natureza, digamos, abstratizante, genérica, dependente demais da interpretação ideológica do usuário. Destarte, axiomas como o famoso MAKE IT NEW ou a fórmula do dichten = condensare convertem-se mui facilmente em bodes expiatórios para a mera legitimação de poéticas pessoais que, não raras vezes, são até mesmo contrárias ao que Pound em verdade praticou. Assim, o MAKE IT NEW com frequência torna-se a desculpa dos que preconizam certo vanguardismo sem sequer compreenderem as implicações militaristas da expressão, assim como para justificarem por vezes uma insistência surpreendente em desprezar ou mesmo ignorar o que quer que tenha sido produzido por poetas antes do século XX ou fora dos cânones mais conhecidos. Da mesma maneira, o dichten = condensare pode acabar invocado por quem acredita que basta jogar três titicas de palavras ao deus-dará de uma página em branco para que seu trabalho se constitua como "conciso". Neste contexto, torna-se quase impossível debater com clareza e discernimento sobre as diferenças entre o fragmentário/conciso e o desconjuntado/desarticulado. Se não atentarmos para tais perigos, e quero com isso dizer TODOS NÓS, o resultado poderá ser o que por vezes já vemos na poesia dos últimos 25 anos: tornarmo-nos poetas que não seriam capazes de terminar um verso com inteligência, graça e sensibilidade, com ou sem enjambement por auxílio, ainda que disso dependessem nossas vidas.

Há porém entre as proposições de Pound um conselho que me parece ainda (e especialmente) hoje uma proposta muito saudável a ter em mente durante a escrita. A proposição foi registrada em uma carta de 1915 de Pound, endereçada a Harriet Monroe, a fundadora e editora da revista Poetry, na qual Pound praticamente a forçaria a publicar poetas como H.D., T.S. Eliot e William Carlos Williams. Aqui vai a proposição, que me parece muito mais prática, clara e funcional que o MAKE IT NEW e outras que circulam desfiguradas no Brasil, em letras garrafais:


"... nothing — nothing that you couldn't, in some circumstance, in the stress of some emotion, actually say."(*)



Ou, em uma tradução possível: "nada – nada que você não possa, em alguma circunstância, sob a tensão de alguma emoção, realmente dizer."

Se muitas outras proposições de Pound podem ser desastrosas para os despreparados por serem demasiado abertas, não ignoro o perigo que esta pode significar, por ser talvez tão fechada. Não faltará quem diga que esta proposição exclui muitas práticas poéticas possíveis, mas eu creio que ela não suprima mesmo a metáfora, o neologismo ou experimentações sintáticas como o hipérbato. Ela apenas enseja uma preocupação maior com a justeza dos propósitos – e salvaria muitos poetas de hoje de uma aparentemente completa falta de senso de ridículo.

Não me parece difícil de argumentar que todos os poetas que respeitamos a observaram de alguma maneira, sem que fosse necessário um poeta como Pound torná-la explícita: de Catulo a Arnaud Daniel, de Orpingalik à princesa Wallâda, de Guido Cavalcanti a John Donne, de Taliesin a Hilda Hilst, de Rainer Maria Rilke a João Cabral de Melo Neto ela poderia ser detectada. Não estou ignorando outras experiências poéticas extremamente belas, necessárias e valiosas, como as que residem na esfera do encantatório e xamânico, chame-se o poeta Herberto Helder ou Paul Celan, assim como o eminentemente construtivo e linguístico da escrita de uma Gertrude Stein.

É por defesa dessas experiências poéticas que precisamos tomar a típica hipérbole de Pound, presente naquele NOTHING repetido ao início da proposição, com o que os americanos chamam de a grain of salt. São no entanto experiências extremas e muito especiais, pois mesmo na melhor poesia, ou digamos em grande parte da melhor poesia destes autores nós encontramos esta qualidade do dizível-sob-tensão. Tanto na "Todesfugue" e "Engführung" de Celan, na poesia de composição altamente permutacional de um livro como A Máquina Lírica, de Helder, como em "Lifting Belly" e tantos outros textos de Stein. É necessário alertar, para que os bufões de plantão não distorçam a discussão, que tal proposição está a anos-luz de distância de qualquer defesa do meramente coloquial na linguagem poética. Pois esta proposta de Pound incentiva uma poesia que evita tanto o coloquial como o livresco. Nada tem a ver com alguns dos conceitos a meu ver equivocados que apregoava Antônio Carlos de Brito (1944 — 1987) pelos idos de 1980. Mas, num momento como o presente, em que os poetas parecem tão divorciados de seu público e alguns charlatães têm se entregado a discursos para justificar uma grande falsificação do que Jakobson pretendia ao dividir a linguagem em funções, insisto que esta proposição seria saudável para os jovens poetas formando-se hoje no país.

E é a partir dela que eu começaria a discutir um poema como "Miscasting", de Hilda Machado. Como a poeta é praticamente desconhecida no país, tendo infelizmente morrido sem publicar sua poesia em livro, deixo vocês em primeiro lugar com o poema.


Miscasting


“So you think salvation lies in pretending?”
Paul Bowles



estou entregando o cargo
onde é que assino
retorno outros pertences
um pavilhão em ruínas
o glorioso crepúsculo na praia
e a personagem de mulher
mais Julieta que Justine
adeus ardor
adeus afrontas
estou entregando o cargo
onde é que assino

há 77 dias deixei na portaria
o remo de cativo nas galés de Argélia
uma garrafa de vodka vazia
cinco meses de luxúria
despido o luto
na esquina
um ovo
feliz ano novo
bem vindo outro
como é que abre esse champanhe
como se ri

mas o cavaleiro de espadas voltou a galope
armou a sua armadilha
cisco no olho da caolha
a sua vitória de Pirro
cidades fortificadas
mil torres
escaladas por memórias inimigas
eu, a amada
eu, a sábia
eu, a traída

agora finalmente estou renunciando ao pacto
rasgo o contrato
devolvo a fita
me vendeu gato por lebre
paródia por filme francês
a atriz coadjuvante é uma canastra
a cena da queda é o mesmo castelo de cartas
o herói chega dizendo ter perdido a chave
a barba de mais de três dias

vim devolver o homem
assino onde
o peito desse cavaleiro não é de aço
sua armadura é um galão de tinta inútil
similar paraguaio
fraco abusado
soufflé falhado e palavra fútil

seu peito de cavalheiro
é porta sem campainha
telefone que não responde
só tropeça em velhos recados
positivo
câmbio
não adianta insistir
onde não há ninguém em casa

os joelhos ainda esfolados
lambendo os dedos
procuro por compressas frias
oh céu brilhante do exílio
que terra
que tribo
produziu o teatrinho Troll colado à minha boca
onde é que fica essa tomada
onde desliga



Um poema não é apenas linguagem que se formula sob tensão, ele é também a textualidade que intensifica nossas emoções cotidianas, e o grito passa a não apenas expressar dor, mas a chamar a atenção do ouvinte para a existência da garganta e o talento para o grito. Eu conseguiria imaginar-me lançando muitos destes versos do poema de Hilda Machado à fuça de alguém, mesmo que fosse num momento, digamos, de embriaguez. Mas penso também que, como escreveu o crítico norte-americano Hugh Kenner ao discutir o trabalho de Williams Carlos Williams: “art lifts the saying out of the zone of things said” (Homemade World, 1975), algo como “a arte ergue e retira o dizer da zona das coisas ditas”. Seria muito interessante unir esta afirmação à de Pound e sua linguagem poética que apresenta uma textualidade que poderia ser, sob a tensão de alguma emoção, realmente dita. Ou seja, a poesia poderia ser uma espécie de tensão dentro do dizível. Qualquer coisa, menos o clichê já um tanto ridículo do dizer o indizível como parâmetro da arte poética. Com honrosas exceções, este discurso do poeta que diz o indizível é geralmente sinal claro de charlatanismo.


Como boa poeta que era, a wit e inteligência de Hilda Machado tornam-se claras já na escolha de seu título. Ela, que era pesquisadora do cinema, parte do conceito de "miscasting", ou seja, a escolha inadequada de um ator para determinado papel: neste caso, o de amante da poeta. Não é humor barato. É claro que tal poema de Hilda Machado integra-se à tradição da poesia lírica, aquela que, até poucos anos, estava em completo desprestígio por aqueles que "mimetizaram" exageradamente certas proposições de João Cabral de Melo Neto e Augusto de Campos, entre outros. Durante a década de 90, foi como se a primeira pessoa do singular se tornasse tabu. Com medo do sentimental, obliterou-se o lírico. Para evitar o verborrágico, praticou-se um minimalismo que raramente parecia realmente articulado. Que Hilda Machado, assim como aquela outra maravilhosa Hilda, a Hilst, tenha composto tal poesia e a mantido em segredo possa ser talvez compreendido pela hostilidade crítica com que a poesia lírica fora tratada nos últimos 25 anos. Como ela escreve, a poeta declara-se "mais Julieta que Justine", ainda que esteja agora entregando este cargo e outros pertences. Trata-se de poesia lírica impiedosa. Forma-se numa composição bastante variada em seus registros. Escrita tesa, em que o aparentemente coloquial é alternado com o marcadamente aliterativo e musical, como em "há 77 dias deixei na portaria / o remo de cativo nas galés de Argélia", em que a imagem tão cotidiana de uma portaria de prédio é justaposta ao verso tão belo, estranho e musical sobre o "remo de cativos nas galés de Argélia". Tal talento, incomum nas últimas décadas, pode ser sentido com força ainda em versos como "mas o cavaleiro de espadas voltou a galope / armou a sua armadilha / cisco no olho da caolha / a sua vitória de Pirro". O poema une o elegante e o vulgar, nem trivialmente coloquial nem tacanhamente literário, dicções justapostas, criando uma espécie de equilíbrio de expressão. Em vários momentos, uma imagética que hesita entre o paradoxismo e a ironia.

O interessante em um texto como este, especialmente contra o pano-de-fundo da poesia da década de 90, por exemplo, e à luz ainda da proposição de Pound por uma poesia dizível-sob-tensão, é que ele borra qualquer fronteira demasiadamente clara entre poesia e prosa. O que nos lega é uma textualidade em que a composição está ciente de sua construção e seus artifícios, mas tais artifícios vêm conjugados ao desejo de que o texto não esteja exilado em apenas um lado da fronteira a teoricamente separar o escrito e o oral. Ou seja, o texto funciona na voz e na página, como é o caso de quase todos os poetas que sobreviveram aos séculos de naufrágio do contexto estético em que poetaram. Nunca na literatura brasileira parece-me ter havido, como a partir da década de 90, um divórcio estético tão grande entre poetas e prosadores, os primeiros frequentemente pecando pelo livresco e os últimos pelo trivial. A situação, eu pretendo argumentar, começou a ser revertida com o surgimento dos poetas que quero discutir nesta série de artigos.

Os poemas de Hilda Machado não apresentam respostas, mas apenas mais perguntas. Não é literatura de auto-ajuda, é literatura de auto-estorvo. Não se trata do que os concretistas costumavam chamar de hedonismo. Hilda Machado assume responsabilidade total perante a sua linguagem, mas a enquadra nas primeiras pessoas do singular de seus verbos. O ser sardônico não se conta entre os hedonistas, pois já não sabe muito bem a diferença entre o prazer e o sofrimento, seja o seu ou o alheio.

"Miscasting" foi publicado na revista Inimigo Rumor. No segundo número impresso da Modo de Usar & Co. nós publicamos outros poucos poemas de Hilda Machado. Entre eles, duas outras pequenas gemas de quilates que latem a quem tem ouvidos ainda sãos após tantos anos de literatice.

Julguem, por si mesmos, eu peço, se pérola ou porca o que vem a seguir:

O cineasta do Leblon

“Aquele que escavar em sua consciência
até a camada do ritmo e flutuar nela
não perderá o juízo.”
Nina Gagen-Torn


O brilho de laranja ao sol
amendoeira rubra e pavão
oculta sobressaltos faustianos
encenam-se dramas na alma
suadas peripécias
lágrimas
mímesis
em sítios escusos está a mocinha raptada por um turco
e a nudez do missionário espancado
folheia-se uma antologia de acidentes
títulos afundam
e no lodo
personagens sem nome
e escândalos de fancaria

O comércio incessante
distrai das caudalosas sociologias do fracasso
idades do ouro perdidas
terror espetacular
recorta o esforço de colosso trágico
alçar-se acima da imensa massa de vencidos
violinos pela indesejada que fatalmente alcança e ceifa
carnaval exterior que é dublagem

Nos domingos de lua cheia
um infante sôfrego obriga a minuciosos tratados
miuçalhas
monopólio
asperezas
contrabando
e então
razias de corsário

na lua nova cruzo a cidade pra beijar a sua boca
transpor morros e encontrar a elevação
tropeça-se em pétalas de rosas
em trufas
visitas ao paraíso
as quartas-feiras são turvas
e trazem as penas do inferno
telefonemas seus
telefonemas meus
telefonemas da outra
e a ex
compomos o obrigatório conflito
repetir com honestidade a velha trama
até que ao fim do primeiro bimestre
erra-se no açúcar
escorrega-se na farsa
e mudam-se todos para a novela das 7

Homem da lua
fantasia de rudes hormônios
o bicho se coça
fervor marcial e bico de passarinho
cavalo rampante que rasga com as patas convenções de estilo
atravessa pontes queimadas
alcançou o vale feroz
terremoto maior que o de Lisboa arrasa cidadelas
afrouxa parafusos
e do colchão abala a mola-mestra

ouviu, carro?
tribos bárbaras desabam sobre a minha Europa

ouviu, montanha?
mudaram os livros que eu agora levo pra cama
antigas lendas fabulosas
uma grosseira rapsódia
cinco escritos libertinos
eu bebo como num banquete em Siracusa
e gozo como as prostitutas de Corinto
palmeira, ouviu?


Ninguém em sã consciência poderá dizer que se trata de poesia que faz concessões. O sarcasmo doloroso de Hilda Machado parece-me extremamente sofisticado, em nenhum momento cede ao facilmente sentimental. Trata-se de uma poeta que sabe, como disse Pound, que only emotion endures, mas o emocionante aqui não segue roteiro de comédia romântica, mas o roteiro de um filme de terror em que a vítima se apaixonasse pelo assassino logo antes da machadada. É uma poeta que parece estar ciente de todas as nossas desilusões pessoais e comunitárias: "O comércio incessante / distrai das caudalosas sociologias do fracasso / idades do ouro perdidas / terror espetacular / recorta o esforço de colosso trágico / alçar-se acima da imensa massa de vencidos / violinos pela indesejada que fatalmente alcança e ceifa / carnaval exterior que é dublagem". Este último verso ilustra como H. Machado não está pregando naturalismos de expressão, e que, nesta nossa sociedade, podemos no máximo entregar-nos à distração do comércio. E seguimos, por já não parecer haver muitas escolhas mais. Como escreve em uma das estrofes:

compomos o obrigatório conflito
repetir com honestidade a velha trama
até que ao fim do primeiro bimestre
erra-se no açúcar
escorrega-se na farsa
e mudam-se todos para a novela das 7



Proposições críticas fazem sentido em contextos específicos, jamais são fórmulas de sucesso imutáveis. No momento em que João Cabral de Melo Neto e o Grupo Noigandres, por exemplo, surgiram no cenário poético brasileiro das décadas de 40 e 50, muitas de suas proposições faziam sentido naquele momento específico, em que a poesia brasileira parecia depender demais de sentimentalismo e frouxidão composicional. Não podemos nos esquecer que a literatura e poesia brasileiras já contavam com excelentes medulas em meio à aparente geléia geral, com Machado de Assis, Sousândrade, Lima Barreto, Carlos Drummond de Andrade e (por que não?) o próprio Manuel Bandeira em vários poemas. Certos elementos formais que haviam se afrouxado voltaram a ser calibrados. Repetidos no contexto dos últimos 20 anos, tais práticas tornaram-se meros discursos, engendrando textos que passaram a pedir calibrações de outra natureza. A proposição de Pound citada no início deste artigo poderia trazer elementos muito saudáveis para a produção poética contemporânea, se há ainda algum interesse por parte dos poetas em ter alguma relevância cultural no mundo de hoje. Há vários mitos poético-ideológicos em voga hoje no Brasil que precisam ser questionados, como, entre outras, a leitura que se faz hoje sobre a função poética, para justificar a escrita que nada diz e nem o faz de forma nova, inteligente ou interessante. Já ajudaria muito se percebêssemos que o substantivo em questão é FUNÇÃO. Entre os guias possíveis, proponho aqui Hilda Machado, que pode, com apenas poucos poemas conhecidos, ensinar mais que a obra completa de muitos.


--- Ricardo Domeneck

§

O nariz contra a vidraça
Hilda Machado


como a paisagem era terrível
mandou se fechassem as janelas
o nariz contra a vidraça e o fla-flu comendo lá fora
genocídios, promessas, plenilúnios
O festim de Nabucodonosor, a vitória dos pó-de-arroz
as dores do pai e os gritos de amor
são agora aquarelas pitorescas

O nariz contra a vidraça
melhor ainda atrás da persiana
ela com seus preciosismos
unhas feitas entre desfiladeiros de livros
barricadas contra o sublime e o medo

Discreta voyeuse
o sofá combinando com o tom das exegeses
a polidez dos móveis, avencas, decassílabos, filmes russos
perífrases sobre paninhos de crochê
e em vez de carne poemas no congelador

Anônima, dizia sempre à manicure
e apesar das mãos que enrugam
as unhas bem curtas e o esmalte claro, por favor

Um dia, o leite derramado na cozinha, saiu
garras vermelhas, bateu à porta do vizinho


§


(*) Carta pra Harriet Monroe (London, 1915): "Objectivity and again objectivity, and expression: no hindside-before-ness, no straddled adjectives (as 'addled mosses dank'), no Tennysonianness of speech; nothing—nothing that you couldn't, in some circumstance, in the stress of some emotion, actually say." Ezra Pound.


** O autor agradece a Dirceu Villa pela ajuda em localizar a fonte exata da citação de Pound.


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2 comentários:

Sebastião Ribeiro disse...

"Há vários mitos poético-ideológicos em voga hoje no Brasil que precisam ser questionados, como, entre outras, a leitura que se faz hoje sobre a função poética, para justificar a escrita que nada diz e nem o faz de forma nova, inteligente ou interessante. Já ajudaria muito se percebêssemos que o substantivo em questão é FUNÇÃO."

Prezado Ricardo,

mais uma vez você nos proporcionou momentos de verdadeira FORTUNA crítica... Gostaria que quando lhe for mais conveniente, você se manifestasse com mais largura a respeito desta dita 'função' poética; creio que esta discussão deve ser endossada por uma voz interessante como a sua, além daquela se fazer necessária à compreensão de nossa 'insistência' em fazer poesia no mundo atual.

Abraços.

josé da silva disse...

É por textos como este que a poesia de um país se movimenta!

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