quinta-feira, 30 de agosto de 2018

No sítio da terra pequena


                          a Leonardo Fróes

Jamais pensei um dia entre capivaras
e coatis descobrir a costela-de-adão,
ereta às vésperas do enfolhamento.
Que monstra deliciosa! Fazia sombra
alta o amansa-senhor, suas flores
vermelhas e seu chá antigo, sonífero
que espera os buchos dos condes
e barões do Rio de Janeiro de hoje.
Como se para mim, o manacá florescia
às bordas do caminho, para mim!
eu que os conhecia apenas da pintura
de Tarsila do Amaral. E quanto
cresceu o guapuruvu, pau-de-tamanco,
desde minha chegada a este sítio?
Ao redor aninhavam-se outros bichos
nas rochas da Serra dos Órgãos.
A cerração baixa deixava o ar ruço.
Não longe, calva como outras pedras
enormes dessa terra, erguia-se
a Maria Comprida em gnaisse-granito,
que outro poeta escalou para ser-lhe
permitido escrever sobre todos
os animais de montanha:
“agora tem de aprender a descer.”
Eu, que perco o fôlego nas escadarias
dos prédios de novos condes e barões
com seus elevadores sociais
e de serviço, cosmopolitinha-caipirão,
perguntava que pássaros
eram aqueles que lembravam faisões.
Jacus! Jacus. Ali estava eu, menos
Adão com o poder de nomear
do que tataraneto mestiço de colonos
e nativos entremeados na morte
das línguas, perguntando cabisbaixo:
será tarde, ao zunir dos mosquitos
da febre-amarela, para fugir pela mata,
irmão de lobos-guarás e vira-latas,
das cinzas e brasas dos paus-brasis?

*

Petrópolis — Rio de Janeiro, 24 a 29 de agosto de 2018.

.
.
.

Nenhum comentário:

Arquivo do blog