Chove em São Paulo. Um pé d’água, um toró. À saída da estação de metrô da Consolação, uma jovem deixa cair seus livros na rua onde já se formavam poças. Imediatamente, uma senhora mais velha acudiu, um rapaz também abaixou-se para pegar livros, e uma outra moça começou a mover compras de uma sacola de plástico a outra para que uma delas se esvaziasse e ela pudesse cedê-la à moça dos livros agora molhados, que agradecia, agradecia, obrigado, obrigado, obrigado. Se o leitor considerar isso relevante, o grupo era formado por duas moças de ascendência europeia, um rapaz de ascendência africana e uma senhora de ascendência asiática.
Não era uma catástrofe a queda dos livros, não mudava os rumos da República, não deteve o trânsito. Mas era uma urgência, e as três pessoas ao redor da moça — dos livros nas poças de chuva — agiram com a presteza e a rapidez que pedia a situação. Rápido!, os livros se molham, não foram feitos para molhar-se os livros. Não sei nem sabiam eles em quem os outros votaram nas últimas eleições, o que pensam sobre qualquer questão que talvez os levasse a se ofender mutuamente nas redes sociais. Não importava naquela urgência das coisas que se estragam. Os livros molhavam-se, a moça tinha as mãos presas, agiram rápido, sem pensar, era o outro na chuva com suas coisas relevantes, irrelevantes. Agradeceram-se e partiram sob a chuva.
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