terça-feira, 29 de janeiro de 2019

O Paraopeba e os rios largos de dentro


Oswaldo Goeldi. "Peixe Vermelho". 1950. xilogravura em cores.  21 x 27,5 cm.


O Paraopeba e os rios largos de dentro

Os afluentes todos do rio
engasgam sem milagre
de peixes. Em cada asfixia
morremos com os bagres.
Surubins. Piaus. Traíras.
Nós, o povo biodegradável.
Mesmo em nome, Minas
Gerais urrava essa profecia
do fim de toda piracema.
Que a Cuba vá Prosérpina.
Nos brônquios, queima
a falta de ar qual no menino
fraco que fui, o enfermiço
da casa, bronquite perpétua,
pulmões a chiar estreitos.
Abro boca, narinas e o peito
ao pensar naqueles peixes
boquiabertos em seu pânico,
lançando-se fora das três
margens do rio. Nos jazigos
do lamaçal, as meninas.
Tornou-se tijolo o pedreiro.
Os sermões do oxigênio
que nos agrega aos vivos
e em falta nos desatrela.
Nas orlas da boca, a língua
resseca. Eu inspiro, expiro.
Nas cozinhas todas trinca-se
o barro de filtros e moringas.

*

Berlim, 28 de janeiro de 2019, com Brumadinho e o Rio Paraopeba na cabeça e no peito.

.
.
.

Nenhum comentário:

Arquivo do blog