sexta-feira, 19 de agosto de 2011

Aérea esperança!

Cabo das Tormentas ou Cabo da Boa Esperança?

Então, o amigo disse-lhe em tom de quem só conhece conjunções adversativas: "Não comece a nutrir esperanças!", e ele olhou bem o focinho do amigo, seguindo de norte a sul e leste a oeste o rosto, e sentiu algo que oscilava entre a pena e a compaixão, respondendo em pergunta, bravo: "Que direito você tem de dizer isso a outra pessoa?", e o amigo não entendeu seu desconcerto, pois há muito pertencia aos que confundem a "nutrição de esperanças" com a "manufatura de ilusões", sem perceber que a esperança, como a fé, é o que Søren Kierkegaard chamou de salto no escuro, consciente de que talvez não haja rede de segurança ao fundo, ou a esperança, ele queria dizer, quiçá seja o que ele mesmo chamou um dia de um "sim de olhos fechados", lucidez de encarar o impossível, como os versos de Marianne Moore, naquele que é e foi e sempre seria um poema-cerne de seu código de conduta, "hope not being hope / until all ground for hope has / vanished", mas há também os versos do português João Apolinário, "O que me cansa / é o diabo da esperança", mas ele então saiu de casa, caminhou certeiro para um encontro que parecia ter a finalidade de todas as chances da felicidade, pensando no poema de Manuel Bandeira, aquele sábio dentuço que estava ciente de que a esperança não é qualquer facilitador, pelo contrário, ela pesa e pensa, e seus passos eram firmes e ele cantarolava o "Rondó do capitão" com o coração pesado de esperança.


Rondó do capitão
Manuel Bandeira

Bão balalão,
Senhor capitão.
Tirai este peso
Do meu coração.
Não é de tristeza,
Não é de aflição:
É só de esperança,
Senhor capitão!
A leve esperança,
A aérea esperança...
Aérea, pois não!
Peso mais pesado
Não existe não.
Ah, livrai-me dele,
Senhor capitão!


§





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