domingo, 2 de agosto de 2020

Poema e leitura de Max Martins (Belém do Pará, 1926-2009)


MAX MARTINS (Belém do Pará, 1926-2009)

Max Martins foi um poeta brasileiro, nascido em Belém do Pará em 1926. Após os estudos de Literatura, passou a colaborar em revistas e suplementos, como a revista literária Encontro, publicando os primeiros poemas no Suplemento Literário da Folha do Norte em 1946 e 1951. Estreou com o livro O Estranho (1952), seguido, entre outros, pelos livros Anti-Retrato (1960), O Ovo Filosófico (1976), O Risco Subscrito (1980) e 60/35 (1985). O poema abaixo, inspirado no lendário mercado de Belém do Pará, foi publicado no livro H'era (1971), e considero-o um de seus mais importantes. O vídeo com leitura do poeta faz parte do documentário Porto Max (2009), do coletivo da Fundação Curro Velho.



VER-O-PESO

A canoa traz o homem
a canoa traz o peixe
a canoa tem um nome
no mercado deixa o peixe
no mercado encontra a fome

a balança pesa o peixe
a balança pesa o homem
a balança pesa a fome
a balança vende o homem

                     vende o peixe
                     vende a fome
                     vende e come

a fome 
vem de longe
nas canoas
ver o peso
come o peixe
o peixe come

                     – o homem?

o homem não come
come o homem
compra o peixe
compra a fome
vende o nome
vende o peso

                    – peso de ferro
                    – homem de barro
 
pese o peixe
pese o homem
é a fome
vem do barro
vem da febre
(a febre vê o homem)

veja a lama
veja o barro
veja a pança

                     o homem
                     come a lama
                     lambe o barro

ver o verde
ver o verme
o verme é verde

está na lama
está na alma
é só escama
a pele do homem
está com fome
vê o peixe
vê o prato
não tem peixe
tem fome
a fome pesa
o peso da fome
peça por peça
pese o peixe
deixe o peixe
veja o peso
peixe é vida
peso é morte
homem é fome
peso da morte
peixe de morte
a sorte do peixe
é o peso
azar do homem

pese o peixe
pese o homem
o peixe é preso
o homem está preso
presa da fome

ver o peixe
ver o homem
vera morte
vero peso.

– Max Martins, in H'era (1971)

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