quinta-feira, 12 de fevereiro de 2009

As medidas de distância de Mona Hatoum





Mona Hatoum é uma das artistas que mais tiveram impacto sobre o meu trabalho como poeta. De origem palestina, nascida no exílio em Beirute (1952), é uma das criaturas que me ensinam a lidar com minha língua e minhas línguas, a "nacional", as "estrangeiras", de forma crítica, sem ilusões de naturalidade: aquela a ser preenchida nos formulários de inclusão social. Estrangeiras, oh estrangeiras, se é que uma língua segue sendo estrangeira após tantas carícias sintáticas e hecatombes semânticas perpetradas através dela, nos carinhos na cama com amantes, nas pelejas em plena rua com os mesmos.

Aprendo, com Mona Hatoum e outros artistas como ela, mais sobre a minha sonhada poética de implicações. Também a ver e ouvir a poesia como language art, não apenas literária.

Neste trabalho em vídeo, chamado "Measures of distance" (1988) ::: poesia verbivocovisual ::: Mona Hatoum sobrepõe, a imagens de seu corpo, imagens da caligrafia árabe das cartas de sua mãe, as quais a artista passa a oralizar/traduzir para o inglês, justapostas a conversas em árabe entre mãe e filha, gravadas em Beirute.

Este trabalho tem, em minha opinião, inúmeras implicações interessantes para o debate poético contemporâneo:

§ - a relação entre escrita e oralidade, através da vocalização, feita por Hatoum, das cartas de sua mãe;

§ - a analogia entre tradução e exílio, num ato de contextualização, enquanto Hatoum (em um trabalho intitulado "Medidas de distância") traduz, para sua nova língua - o inglês -, seu árabe de origem;

§ - a possível dissolução ou (ao menos) turvar de dicotomias dogmáticas como as que buscam separar, de forma exata e precisa, o que nós vemos como marés conceituais, como subjetividade/objetividade, ou interno/externo - com suas implicações políticas óbvias para a discussão do conceito de nacional;

§ - nas discussões entre mãe e filha sobre o pai e as relações entre linguagem feminina e masculina, assim como o uso da correspondência entre as duas mulheres, o questionamento est-É-tico do gênero, especialmente em sua frequente associação sub-reptícia na equação GENDER = GENRE;

§ - por fim, a insinuação da escrita como manifestação corporal, tanto na corporalidade de uma escritura em caligrafia, literatura como extensão do corpóreo, como pelo reforço dado a esta idéia pelas imagens do corpo da artista-poeta --- insinuação que poderia substituir parâmetros-de-escultura na discussão crítica da poesia e da escrita, por parâmetros-de-performance.

Nenhum comentário:

Arquivo do blog