quarta-feira, 9 de setembro de 2009

Último relatório do festival e outros poetas

Nas duas últimas postagens, comentei sobre o festival de Medana, postei poemas do cíprio Mehmet Yashin (n. 1958) e do russo Aleksandar Skidan (n. 1964), além de mencionar o poeta esloveno (e tradutor das Obras Completas de Platão) Gorazd Kocijančič (n. 1964). Nesta última postagem sobre o festival esloveno, gostaria de comentar rapidamente sobre alguns outros poetas que chamaram a minha atenção.

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É claro que se torna mais fácil apreciar o trabalho de poetas ativos em línguas que dominamos. Entre os poetas anglófonos em Medana, senti muito apreço pelo trabalho permutatório de escrita da canadense Angela Carr. A poeta vive em Montreal e publicou em 2006 a coletânea Ropewalk. No fim deste ano, deve lançar o volume The Rose Concordance. O poema a seguir está na antologia do festival, com o qual Carr abriu sua leitura. Pretendo traduzi-lo para a Modo de Usar & Co., mas por enquanto o mostro a vocês aqui no original:

Of the middle
Angela Carr

Our language with no body, nor less breath running.
Our language less in motion than motion.
Our tongues between properties, dividing,
nipples, the centrelanguage, heartbeat.
By the middle of September I had no body,
I was centrelanguage dividing the missing heartbeat,
my heartbeat, from the present.
By the middle of September I had no property, no body.
By the middle.

I bled language until I had no body.
Between our properties dividing turnips
from snow in the cold bare
vicinity of our language.
By the middle of winter
our story was less motion, language bled from me.
By the middle, I was missing
dividing months from the human
language with no body
honeycombs
frozen
honed
shhhh
but
I cannot breathe nor run with this less language.

I bled language until I had no body.
Bled between turnips and snow
Bled the cold bare language.
By the middle
Our story was less
Language had bled from me
So our story was less.


§

Angela Carr e eu conversamos muito sobre a relação entre gênero e gêneros (GENDER/GENRE), também sobre poetas como Susan Howe e Rosmarie Waldrop.

Esta última foi o ponto de contato, o gosto comum que iniciou uma boa conversa com outro poeta anglófono, ainda que este tenha na verdade nascido na antiga União Soviética, escapando com os pais quando ainda era muito pequeno, hoje poeta americano e tradutor do russo: Matvei Yankelevich. Publicou os livros The Present Work (2006) e Boris by the Sea (2009). Traduziu amplamente para o inglês o poeta russo Daniil Kharms (1905 - 1942), um iconoclasta amante do absurdo em um regime que não favorecia tais pesquisas poéticas.



O trabalho de Yankelevich liga-o à poesia produzida na cidade de Nova Iorque nas últimas décadas, e aos muitos grupos ligados àquele primeiro grupo específico de poetas da década de 50, que ficaria conhecido como Escola de Nova Iorque (New York School of Poets): Frank O´Hara, John Ashbery, James Schuyler, Barbara Guest, Kenneth Koch. Há pontos de contato também entre a poesia deste tradutor dos poemas "absurdistas" de Daniil Kharms e o trabalho dos poetas conhecidos hoje como flarfistas.

Interessei-me também pelo trabalho da jovem sueca Linn Hansén. Nascida em 1983, Hansén acaba de publicar o livro Ta I trä (a tradução do título para o inglês parece ser Touch Wood). Não consigo deixar de me interessar por esta pesquisa textual que leva a um "deflacionar da linguagem poética", jogando também com as expectativas do gênero.

Seria muito difícil escrever sobre todos os poetas. No debate sobre as possibilidades utópicas para a poesia, foi muito interessante ouvir o poeta e professor de filosofia bósnio Senadin Musabegović (n. 1970), que lutou como soldado em Sarajevo e leu poemas pungentes sobre a guerra, durante a qual foi correspondente também para certas agências internacionais.

Ficarei ainda atento ao trabalho do holandês Bas Belleman, da finlandesa Saila Sasiluoto, da argelina Samira Negrouche e do eslovaco Valerij Kupka. Tenho certeza que estes dias na Eslovênia gerarão frutos que ainda não posso ver claramente.

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4 comentários:

Angélica Freitas disse...

mais uma boa poeta do canadá! :-)

Leonardo Valverde disse...

Ricardo, cheguei aqui via o blog do Érico. E já encontrei umas coisas legais, esta sua experiência na Eslovênia, parece-me fascinante. Tenho um amigo sueco que me falou da Hansén ainda este ano, pensei na época: "ninguém deve conhecer uma poetisa sueca aqui...", errei. Vez em quando passarei por aqui...
Abraço.

Ricardo Domeneck disse...

Angie,
precisamos traduzir a Anne Carson!
beijos
R.

Ricardo Domeneck disse...

Caro Leonardo,

bom saber que você encontrou algumas coisas interessantes no blog. Realmente a poesia sueca é pouquíssimo divulgada no Brasil. Traduzi um poema do Gunnar Ekelöf para a Modo de Usar & Co..

Aqui na Alemanha é possível encontrar livros do Tomas Tranströmer ou, dentre os vivos, do Lars Gustafsson. Quem me dera conhecer realmente bem o sueco para poder traduzir mais.

Que bom que você já havia ouvido falar da Linn Hansén.

Até mais

Domeneck

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