segunda-feira, 21 de janeiro de 2013

Dos heróis pessoais: James Baldwin (1924 - 1987)



“You think your pain and your heartbreak are unprecedented 
in the history of the world, but then you read. It was books 
that taught me that the things that tormented me most were 
the very things that connected me with all the people 
who were alive, or who had ever been alive.” ― James Baldwin


Eu me lembro da situação, de estar na sala de aula nos Estados Unidos. Era provavelmente 1995 e eu tinha ainda uns poucos meses no programa de intercâmbio antes de voltar para o Brasil. Não sei por que motivo a professora de Literatura Americana, professora que eu adorava, mencionou James Baldwin e seu primeiro romance, Go Tell It On The Mountain (1953). Talvez a conversa houvesse guinado para a questão racial, ou quem sabe para a questão religiosa nos Estados Unidos, ou suas interligações. 

Nós líamos um livro por mês em aula e tínhamos que escrever ensaios a respeito. Era a tortura para a maioria e um verdadeiro oásis para mim. Lembro-me de termos lido e discutido livros como as peças Long Day´s Journey Into Night (1956) e Cat On A Hot Tin Roof (1955), de Eugene O´Neill e Tennessee Williams, respectivamente; as novelas The Red Badge of Courage (1895), de Stephen Crane, e Of Mice and Men (1937), de John Steinbeck; coletâneas de contos como The Things They Carried (1990), de Tim O´Brien; e ainda romances como Ethan Frome (1911), de Edith Wharton, e o inclassificável Walden (1854), de Henry David Thoreau.

Quando Mrs. Peak (a professora) começou a descrever Baldwin, seu trabalho e sua importância para as Letras Americanas: e como fizera isso tudo sendo um escritor negro e homossexual assumido em plenas décadas de 50 e 60, eu me lembro de perguntar imediatamente a ela por que não líamos aquele romance em aula. Ela disse, com uma expressão que não saberia descrever: "Os pais de vocês não aprovariam se eu pusesse Baldwin nas mãos de vocês... mas, o que vocês fazem nas horas livres é assunto seu...", e escreveu na lousa em maiúsculas J A M E S B A L D W I N G O T E L L I T O N T H E M O U N T A I N

Eu entendi imediatamente a estratégia, ou, quem sabe, ela tenha simplesmente funcionado de cara comigo: sugerir que um livro era perigoso e proibido, para que a cabeçoila adolescente se interessasse.

Eu só começaria a ler o livro no ano seguinte, após retornar ao Brasil e então embarcar na minha primeira viagem para a Europa, depois de um ano trabalhando – literalmente dia e noite – para juntar o dinheiro. Li o livro de Baldwin em um barco, cruzando um certo mar, de uma civilização antiga para outra. Ali naquelas paragens onde poetas dizem correr um lamento milenar, que envolve os corpos das mulheres e das cabras e das pedras, fazendo com que às vezes até se confundam. E o livro de Baldwin me estripava, me carcomia as entranhas. É necessário ter crescido em um ambiente tão religioso quanto aquele em que cresci, imagino, para se poder compreender o que há de atormentado e tormentoso em um livro como Go Tell It On The Mountain. Segue sendo um dos livros mais fortes que já li, e uma das experiências literárias mais massacrantes que já tive.

É outro exemplo de afinidade est-É-tica minha com um escritor convulsivo, febril, enraivecido... como escritores tão diversos quanto Hilda Hilst; ou Kenzaburō Ōe; ou Emily Brontë; ou Heiner Müller. Não tanto, pelo menos para mim, com os estilistas frios. James Baldwin escreveu: “All art is a kind of confession, more or less oblique. All artists, if they are to survive, are forced, at last, to tell the whole story; to vomit the anguish up.” Sei o que quanto isso desagradará os de temperamento mais "seco e econômico". Mas é, ao menos, o único modus operandi do qual posso me dar ao luxo. 

Aprendi muito com Baldwin. É um de meus heróis pessoais. Convido vocês a ouvirem o próprio, nesta gravação de um excerto de seu "The Artist´s Struggle for Integrity". É tempo de voltar a ouvir Baldwin.




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