sexta-feira, 6 de dezembro de 2013

Traduzindo dois poemas de Isabella Motadinyane (África do Sul, 1963 - 2003)


Soube da morte de Nelson Mandela esta manhã. Após ler vários artigos interessantes sobre o grande homem que foi, revolucionário ativista acima de tudo, passei algum tempo pesquisando a poesia sul-africana moderna e contemporânea. Conhecia muito pouco, quase nada além da poeta afrikaans Ingrid Jonker (1933 – 1965), o trabalho de Lesego Rampolokeng e o de Breyten Breytenbach, com quem cheguei a participar de um par de eventos.

Descobri alguns poetas muito interessantes, como S.E.K. Mqhayi (1875 – 1945) e Mzwandile Matiwana (1967 - 2009) e, entre os vivos, Keorapetse Kgositsile, Mxolisi Nyezwa e Jethro Louw.

Mas foram alguns poemas de Isabella Motadinyane que me marcaram hoje. Nascida em Soweto, em 1963, foi uma das fundadoras do coletivo Botsotso Jesters em 1994, que viria a se tornar também editora. Teve poemas publicados em duas antologias do coletivo, We Jive Like This (1996) e Dirty Washing (1999). Seus poemas foram reunidos postumamente no volume Bella (2007). Não encontrei informações sobre a causa de sua morte, aos 40 anos.

Sua poesia está claramente marcada pela tradição oral e pela performance, pelo canto, e a mímica de sua voz parece resistir mesmo no texto impresso. Há ainda certo minimalismo unido a um tom celebratório, de ode e canto, que parecem buscar surtir efeito sobre o leitor por outras estratégias, num ativismo que parece, ao menos nestes poemas abaixo, conclamar à resistência pelo sorriso.

Traduzi dois poemas, a partir da tradução para o inglês por Ike Mboneni Muila e cotejando sons e estruturas com o original. Isabella Motadinyane escrevia usando tanto Sotho (uma das 11 línguas oficiais da África do Sul), como Isicamtho, um dialeto urbano de Soweto.

Vem gente

Paaha
vem gente
paaha
vem gente
é hora de carpir as ervas
é hora da colheita
vem vamos conversar
vem em paz
paaha
vem gente
paaha
vem gente
é chegado o verão
a espiga de milho está madura e tenra
vocês já ouviram
notícias de alegria?
paaha
vem gente
paaha
vem gente


(paráfrase de Ricardo Domeneck)

:

Tlong beso
Isabella Motadinyane

Paaha
tlong beso
paaha
tlong beso
ke nako ya ho hlaolo
ke nako ya kotulo
tlong re buisaneng
tlong ka kutlwano
paaha
tlong beso
paaha
tlong beso
selemo se thwasitse
babele a hodile
na le utlwile na
taba ketse monate
paaha
tlong beso
paaha
tlong beso

§

Quieta bebê

Quieta bebê
anda alta
assovios aqui e ali
sorrindo feito estrela
com o rosto redondo
bebê de covinhas na bochecha
que prendem os olhos
nós vimos seu trabalho aqui
no campo
aqueles que dizem
que você é feia
são uns tolos
deixe-os no equívoco deles
brilha bela e ensolara
ho ha
quieta bebê
ho ha
a propósito
você é a número 1
anda alta bebê
brilha bela e ensolara
quieta bebê
ho ha
donde você se vai
ficam para trás estrelas
fala clã de Mohlakwana
fala clã de Mofokeng
nós vimos seu trabalho
presentes de núpcias
estão a caminho
vai irmã deixe-os zonzos
deixe-os tontos boneca
eles chegaram agora
os que tocarão sax para você

(paráfrase de Ricardo Domeneck)

:

Hoshe ngwana
Isabella Motadinyane

Hoshe ngwana
qata o qatoge
melodi kafa le fa
ngwana dikoti marameng
pososelo eka naledi
sefahlelo sone
botjhitja bo kgatlang mahlo
re bone mesebetsi ya hao
naheng mona
ba reng
o sekobo
ke baikaketsi
ba lese ba iphore jaalo
shine bright sunbeam
hoha
kana wena o motswa mantlha
qata o qatoge thope
shine bright sunbeam
hoshe thope
hoha
moo o fetileng
ho sala dinaledi
thebetha Mohlakwana
thebetha Mofokeng
re bone mesebetse ya hao
digaboi di dizzie ousie
slaat hulle giddy poppy
ba fehlile jwale
ba ho bapallang

.
.
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