terça-feira, 3 de dezembro de 2013

Textículos encontrados num caderno de rascunhos


Poemetos de viagem

I. Da beleza mimética

um menino
muito bonito
na sala
para fumantes
do aeroporto
de zurique
estava a fitar
com a cara
enfiada na tela
os peixes
do aquário que era
porém digital
(ecológicos
os suíços)
e eu
por minha vez
o fitava
e me perguntava
se percebia
que aquilo
não eram mesmo
peixes
e então pensei
ora mas são
peixes

II. Da bondade benfazeja dos céus

Ainda que cínicos
diriam que comprada
bondade é bondade
a aeromoça
oferece-me chocolates
eu aceito os chocolates
não é preciso
o som dos sinos
ou anjo com bandeja
para que se reconheça
uma benfazeja
e que nosso martírio
e a serotonina
nossa de cada dia
são compartilháveis

III. Das mesmices da língua

Foi na cidade
do Porto
que um radialista
ao discutir
em seu programa
os hábitos
sexuais dos jovens
portugueses,
referindo-se ao que nós
brasileiros
chamaríamos de sexo
sem preservativo,
disse “relações
desprotegidas”
e emocionou-me
até o caroço.

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