sexta-feira, 27 de dezembro de 2013

Tal Nitzán traduz para o hebraico meu poema "Ísis Dias de Oliveira (1941 - ?)"



Durante nossa passagem por Tiradentes, durante o Festival Artes Vertentes 2013, conversei muito com a poeta israelense Tal Nitzán sobre a natureza do político no trabalho poético. Foram dias muito bonitos. Tal, após minha leitura do poema "Ísis Dias de Oliveira (1941 - ?)" na Igreja do Rosário, num domingo, disse-me que gostaria de traduzi-lo. Ela é a tradutora israelense premiada de autores latino-americanos como Antonio Machado, Federico García Lorca, Pablo Neruda, Octavio Paz, Jorge Luis Borges, Cesar Vallejo, Alejandra Pizarnik e Cesare Pavese. Fiquei muito tocado, especialmente por levar o nome e a memória de Ísis a outras línguas, aumentando talvez a consciência do que por aqui ocorrer.  Compartilho aqui a tradução, seguida da tradução de Odile Kennel para o alemão e o original. O poema foi publicado pela primeira vez em meu livro alemão, Körper: ein Handbuch (Berlin: Verlagshaus J. Frank, 2013). No Brasil, fará parte do meu próximo livro.



(1941-?) איזיס דיאס דה אוליביירה 



אולי
היתה עכשיו
משועממת ביום ראשון,
עגומה על הספה
או ישנה
אולי גרושה.
אולי היתה חיה
עם שלושה ילדים
שמעולם לא היו לה
בדירה שכורה
זעירה, מאושרת
או אומללה, כמו
שקורה תמיד, אולי. אולי
היתה נועלת בשמש
את נעליה האהובות,
כבר די שחוקות, גנובות
מחברה שאיתה
לא היתה מדברת עוד,
אולי. אולי כבר היתה נופלת
בידי ההתאבדות,
או הבעל השני,
אולי רק סורבה
תמרינדי, אולי.
אולי היתה צוחקת,
מספרת בדיחה
תפלה
שכל החברים
כבר לא מסוגלים
לשמוע, אולי. אולי
היתה תוהה
במה הועיל המאבק
וכל החיים האלה
כדי שהמדינה
תהיה בסוף
כמו שהיא, אולי.
אולי
היתה מהגרת
ומביעה את שמחותיה
עכשיו באקלימים אחרים,
מתבטאת עכשיו בשפות אחרות,
לא זוכרת שום מאבק
ושום גרילה, אולי.
אצבעותיה היו עכשיו אולי
מוכתמות מן הדיו
של עיתון הבוקר
שמשקר לעתים קרובות,
כפי ששיקר כבר אז,
אולי, והדיו היתה
נטמעת עכשיו בלובן
הספל, כפי שחומר
עובר מחומר אל חומר,
אילו חיתה,
אולי.


§

Ísis Dias de Oliveira (1941- ?)

Vielleicht
würde sie sich gerade
langweilen an einem Sonntag
hätte den Blues
auf dem Sofa, oder schliefe
geschieden, vielleicht.
Vielleicht würde sie 
mit den drei Kindern
die sie nie bekam
in einer Einzimmer-
Mietwohnung leben, glücklich
oder unglücklich
wie man eben so ist, vielleicht.
Vielleicht zöge sie
in dieser Minute
in der Sonne ihre abgenutzten
Lieblingsschuhe an
der Freundin stibitzt
mit der sie verstritten wäre
vielleicht. Vielleicht hätte 
der Selbstmord sie längst
geholt, hätte sie schon
den zweiten Mann, eventuell
auch eine Kugel Eis, vielleicht.
Sie würde sich kugeln
vor Lachen, vielleicht
beim Erzählen eines schlechten
Witzes, den ihre Freunde
schon nicht mehr
hören könnten. Vielleicht
würde sie fragen, warum
sie dieses Leben, diesen Kampf
geführt hat, wenn kein
besseres Land
herauskam als dieses.
Vielleicht wäre sie emigriert
wäre heiter in einem anderen
Klima, einer anderen
Sprache, vergessen
die Bewegung
der Untergrund, vielleicht.
Ihre Finger wären vielleicht
voller Druckerschwärze
von der Morgenzeitung
die vielleicht
wie früher
lügen würde
und das Schwarz
färbte ab auf die weiße
Keramiktasse, so wie
Materie von Materie
auf Materie übergeht
sofern lebendig
vielleicht.

§

Ísis Dias de Oliveira (1941 - ?)

Talvez
ela estivesse agora
entediada num domingo,
cheia de banzo no sofá
ou dormindo
divorciada, talvez.
Talvez ela vivesse
com os três filhos
que jamais teve
numa quitinete
de aluguel, feliz
ou infeliz, como sói
ser, talvez. Talvez
vestisse ao sol
os sapatos favoritos
já meio gastos, roubados 
da amiga
com quem já não falasse,
talvez. Talvez o suicídio
já a houvesse colhido,
ou o segundo marido,
quiçá tão-só um sorvete
de tamarindo, talvez.
Talvez estivesse rindo,
contando a piada
sem graça
que todos os amigos
já não aguentavam
ouvir, talvez. Talvez
questionasse
o que valeram luta
e toda aquela vida
para que o País
acabasse
como acabou, talvez.
Talvez 
houvesse emigrado
e submetesse suas alegrias
agora a outros climas,
exprimindo-se noutra língua,
esquecida de militâncias
e guerrilhas, talvez.
Seus dedos agora talvez
estivessem sujos de tinta
do jornal matutino
que mente a miúdo,
como já antes o fazia,
talvez, e a tinta agora
se juntasse ao branco
da louça da xícara,
como se transporta
matéria de matéria
a matéria, se viva,
talvez.


.
.
.

Um comentário:

Paulo disse...

me emocionei com seu poema. obrigado!

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