quinta-feira, 2 de junho de 2011

As prioridades do mundo



Qualquer pessoa
poderia verificar as manchetes
nos principais jornais do mundo
na manhã seguinte. O americano
The New York Times
relatava
a destruição de um tornado
no Missouri, o francês Le Monde
questionava o envio de helicópteros
para a Líbia, o espanhol El País
ocupava-se com as revoltas
do povo sob sua monarquia
e o alemão Frankfurter Allgemeine
espalhava o pânico de uma bactéria.
No Brasil, a Folha de S. Paulo
parecia deveras interessada na renda
de um ex-ministro da Fazenda
e atual Ministro-Chefe da Casa Civil.
Estou ciente de que o acontecimento
que devastara a agricultura e o turismo
dos meus sonhos, esta minha catástrofe
tão natural por causa de uma decisão
unilateral do ministro-chefe
da minha casa civil,
era minúsculo
para o mundo.
Mas a única população
cujo descontentamento
me interessava naquela manhã
era formada tão-só por um cidadão,
por isso busquei a notícia
em locais menores, onde quem
sabe alguém se importasse
com o vácuo de poder causado
pela renúncia do escolhido,
o abençoado, o ungido.
Era
como precisar de uma prova
final
de que não se tratava apenas
de um longo e elaborado
pesadelo banal. Mas no Alasca,
o Anchorage Daily News
informava sobre um barco
superlotado e seu naufrágio,
sem mencionar minha deriva
nas águas, no Alabama
The Decatur Daily questionava
a nova lei para imigrantes ilegais,
inconscientes da evacuação
de minha cidadela dessitiada.
Em Berlim, a imprensa
sensacionalista
alertava contra legumes
contaminados. Nunca
me iludi, prometo. Sempre
soube e ainda sei que o fato
de não ser mais óbvio
encontrar você em meu quarto,
em minha cama, não
merece a primeira página
de qualquer jornal
e são muito mais importantes
e respeitáveis as prioridades
deste mundo
que, no entanto, já não
me é o mesmo.






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9 comentários:

Angélica Freitas disse...

grande. grande. mim falar sua língua.

Ricardo Domeneck disse...

obrigado, angie!

Anônimo disse...

Es geht Ihnen ein bisschen besser... merkt man.
Man schafft es immer, man glaubt dieses Mal klappt es nicht, pero al final, siempre lo conseguimos...

Ein schöner, schönter Text.

Gracias.

Im Übrigen fand ich die letzten Posts sehr gut...

Anônimo disse...

Mto bonito, Ricardo, mto mesmo. Bonito de um jeito melancólico e, ao mesmo tempo, afirmativo.

Leo Gonçalves disse...

!

leo gonçalves disse...

Passei a noite pensando neste poema. Achei que ele é uma bela resposta ao comentário que você fez sobre o Scott-Heron. Datado uma ova. É como dizia o bom e velho Pound: News that stays news. Abração!

Anônimo disse...

oh deus, esse final.

--g. semionato.

Ricardo Domeneck disse...

Queridos, muito obrigado pelos comentários e pela leitura.

Leo: seu comentário me deixou muito feliz.

Ricardo

Anônimo disse...

Me emocionou. Partilho estas águas ilustradas . cada vez seus poemas estão mais lindos. Bjs Nora

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