domingo, 27 de janeiro de 2013

Pequeno texto sobre um trabalho fundamental que forma o meu "Códice"


Alan Strang: ___

"Equus. 
Take me. Whoa, down, easy, boy, easy.
Equus, the Godslave.
Faithful and true, that's it.
He's good.
Equus, son of Fleckwus.
Son of Neckwus.
Walk.
Here we go.
The king rides out on Equus, mightiest of horses.
Only I can ride him.
His neck comes out of my body.
It lifts in the dark. Equus, Godslave.
Now the King commands you.
Tonight, we ride against them all. The hosts of Bowler... the hosts of Jodhpur... 
all those who show you off for their vanity... tie rosettes on your head for their vanity.
Come on, Equus, let's get them.
Trot! Steady, steady! That's it, steady.
Cowboys are watching, taking off their Stetsons.
They know who we are. They're admiring us.
Bowing low unto us. Come on, show them.
Canter!
And Equus the Mighty rose against all.
His enemies scatter.
His enemies fall.
Turn! Trample them!
Stiff in the wind. My mane, stiff in the wind!
I'm raw, I'm raw. Do you feel my raw?
Feel me on you?
On you! I want to be inside you.
I want to be inside you, and be you. Forever one person.
I love you!
Bear me away. Make us now one person.
Amen."

Doctor Dysart: ___ 

"Afterwards, he says, they always embrace. He showed me how he stands in the night, like a frozen tango dancer, inhaling the cold, sweet breath. Have you noticed it about horses, the way they'll stand one hoof on its end, like those girls in the ballet? Now he's gone off to rest, leaving me alone... with Equus. I can hear the creature's voice. He's calling me out of the black cave of the psyche. I shove in my dim little torch, and there he stands... waiting for me. He raises his matted head. He opens his great square teeth, and he says: `Why? Why me? Why, ultimately, me? Do you imagine you can account for me... totally, infallibly, inevitably account for me? Poor Dr. Dysart.´ Of course, I've stared at such images before, or been stared at by them, whichever way you look at it. Weirdly, often now with me, the feeling is that... they are staring at us. And in some quite palpable way, they precede us. Meaningless, but unsettling. In either case, this particular one, this huge, implacable head is the most alarming yet. It asks questions I've avoided all my professional life. A child is born into a world of phenomena, all equal in their power to enslave. It sniffs, it sucks, it strokes its eyes over the whole, uncountable range. Suddenly, one strikes. Then another. Then another. Why? Moments snap together, like magnets forging a chain of shackles. Why? I can trace them. I can, with time, pull them apart again. But why, at the start, they were ever magnetized at all... why those particu/ar moments of experience and no others? I do not know, and nor does anybody else! If I don't know, if I can never know, what am I doing here? I don't mean clinically or socially doing, but fundamentally. These whys, these questions, are fundamental."

O trecho acima é um dos momentos mais marcantes da peça Equus (1973), do dramaturgo inglês Peter Shaffer (n. 1926). Trata-se também de uma das experiências mais importantes em minha vida, como escritor, como pessoa-coisa. Eu a descobri pela primeira vez através da excelente filmagem de Sidney Lumet, Equus (1977), com Richard Burton no papel do Doutor Dysart, e Peter Firth no papel de Alan Strang. Creio que era 2003.




A quem não conhece a peça ou o filme, uma pequena sinopse: o Doutor Dysart recebe em seu consultório uma visita de sua amiga Hesther Saloman, uma assistente social que vem implorar que ele trate de um adolescente que acabou de ser preso. Dysart diz não ter tempo, estar sobrecarregado, e pergunta com empáfia cínica: "O que foi que ele fez? Pôs sonífero na bebida de alguma garota? Fogo em alguma coisa?"

Hesther responde, definitiva: "Ele cegou seis cavalos com uma estaca."



Ao começar a "tratar" Alan Strang, o Doutor Dysart entra em sua própria descida ao inferno dos mitos primordiais, e uma batalha consigo mesmo por ser um sacerdote do que ele passa a chamar de Deus do Normal. Para mim, parece um dos últimos grandes trabalhos da modernidade particular que nos afeta até hoje, daqueles guinchos de angústia pela dessacralização e desritualização do nosso mundo que geraram The Waste Land, de Eliot; o "Cantar LI, ou da Usura", de Pound; "A Janela do Caos", de Murilo Mendes. No pós-guerra, os guichos de angústia já haviam sucumbido a grunhidos de agrura do vazio em obras como La Dolce Vita, de Fellini; ou Deserto Vermelho, de Antonioni. Alguns poucos seguiriam entre os guinchos e os grunhidos, como Andrei Tarkóvski e Hilda Hilst dos anos 70 em diante. Não é à toa que o porco assume posição de destaque na obra de Hilst. E eu já não saberia dizer se eu, na Carta aos anfíbios, estava guichando ou grunhindo, porventura já em plena lamúria, aquela descrita por Eliot: "This is the way the world ends, / This is the way the world ends, / This is the way the world ends, / not with a bang, but a whimper".

Levou algum tempo até que conseguisse achar um exemplar do texto da peça. Mas há alguns anos o tenho.

Este texto de Shaffer, e sua encarnação (todo verbo faz-se carne, a não ser em alguns poetas brasileiros contemporâneos) no filme de Lumet é um dos textos fundamentais do que eu chamo de meu Códice, uma lista de textos que formaram (alguns diriam deformaram) minha mente e meu senso de est-É-tica. E é nisso que esta minha ideia de um Códice se diferencia do Paideuma de Pound. Pois enquanto, no Paideuma, Pound nos presenteou com aquela lista maravilhosa de trabalhos infalíveis nos quais podemos aprender sobre a poesia como poiesis, como tekhné, o que me fascina nos trabalhos que vão formando esta minha lista pessoal, este códice, é sua insistência em não ser apenas estética, mas de embater-se e pelejar com o mundo e o Mundo, de forma febril, desesperada, desbordante, impura em suas contaminações com a Vida.

Talvez outro aspecto da diferenciação entre o artista como artesão e o artista como interventor?

Algum dia quero publicar um livro com este título, Códice, contendo uma série de artigos ou ensaios em que me embata e peleje com estes textos. Seria o mais perto que eu poderia chegar do Itinerário da minha Pasárgada. Posso mencionar aqui alguns... como Do Sentimento Trágico da Vida (1933), de Miguel de Unamuno; Temor e Tremor (1843), de Kierkegaard; o poema "Janela do caos", de Murilo Mendes; o romance Qadós (1973), de Hilda Hilst; o conto "Nada e a nossa condição", de João Guimarães Rosa; o filme Krótki film o miłości (Não Amarás, 1988), de Krzysztof Kieślowski, assim como todo o seu Decálogo; e vários outros. Nos últimos dois anos, Simone Weil tem sido um fantasma-mor a pairar sobre minha cachola.

Porque é difícil explicar o que é viver com o que eu chamo de Complexo de Jonas, título de um poema em que trabalho aos pouquíssimos, jogando com o tema em tantos outros poemas, porque tenho medo de escrever este.

E tudo isso, aqui, apenas para recomendar a vocês que assistam à filmagem de Sidney Lumet para a peça Equus, de Peter Shaffer, e leiam o texto em si. Pois neste mundo que segue insistindo que adoremos ao deus da normalidade, do uniforme,  do concreto e sólido e prático, Alan Strang, e, mais importante: gente de carne e osso, ao menos galoparam no Campo Ha Ha. E você? E eu?


Da peça Equus, diálogo entre o Doutor Dysart e Hesther:

 __ I'm talking about passion, Hesther. You know what that word meant originally? Suffering. The way you get your own spirit through your own suffering. Self-chosen. Self-made. This boy's done that. He's created his own desperate ceremony just to ignite one flame of original ecstasy in the spiritless waste around him. He's destroyed for it, horribly. He's virtually been destroyed by it. One thing I know for sure, that boy has known a passion more ferocious than I have known in any second of my life. Let me tell you something: I envy it.

__ You can't.

__ Don't you see? That's what his stare has said all this time. "At least I galloped. When did you?" I'm jealous, Hesther. Jealous... of Alan Strang.

__ That's absurd.

__ Is it?

__ Yes, utterly. Utterly!

__ I go on about my wife. Have you thought about the husband? The finicky, critical husband, with his art books on mythical Greece? What real worship has he known? Without worship, you shrink! It's brutal. I shrank my life. No one can do it for you. I settled for being pallid and provincial out of my eternal timidity. The old story of bluster, and do bugger-all. I didn't even dare to have children... didn't dare to bring children into a house and marriage as cold as mine. I tell everyone Margaret is the puritan, I'm the pagan. Some pagan! Such wild returns I make to the womb of civilization! Three weeks a year in the Mediterranean. Beds booked in advance, meals paid with vouchers, cautious jaunts in hired cars, suitcase crammed with Kaopectate. What a fantastic surrender to the primitive! The "primitive." I use that word endlessly. "The primitive world," I say,"what instinctual truths were lost with it!" While I sit baiting that poor, unimaginative woman with the word, that freaky boy is trying to conjure the reality. I look at pages of centaurs trampling the soil of Argos. Outside my window, that boy is trying to become one in a Hampshire field. Every night I watch that woman knitting, a woman I haven't kissed in six years. And he stands for an hour in the dark, sucking the sweat off his god's hairy cheek. In the morning, I put away my books on the cultural shelf, close up my Kodachrome snaps of Mount Olympus, touch my reproduction statue of Dionysus for luck and go off to the hospital to treat him for insanity. Now do you see?






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Book of Job, Chapter 39 (King James Bible)

 19. Hast thou given the horse strength? hast thou clothed his neck with thunder? 
 20. Canst thou make him afraid as a grasshopper? the glory of his nostrils is terrible. 
 21. He paweth in the valley, and rejoiceth in his strength: he goeth on to meet the armed men. 
 22. He mocketh at fear, and is not affrighted; neither turneth he back from the sword. 
 23. The quiver rattleth against him, the glittering spear and the shield. 
 24. He swalloweth the ground with fierceness and rage: neither believeth he that it is the sound of the trumpet. 
 25. He saith among the trumpets, Ha, ha
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sábado, 26 de janeiro de 2013

Mundo lusófono, em três notícias: Lisboa, Rio de Janeiro e Recife

Notícias: o mundo lusófono, em três cidades

LISBOA

O poeta Miguel Martins convida, hoje dia 26, pelas 22.30h no bar do teatro A Barraca, para o concerto de A FAVOLA DA MEDUSA - "Bucolique Mélancolique II".

Entrada: 4 euros, com direito a uma cerveja.

Alexandre Andrade - trompete; Filipe Homem Fonseca - guitarra eléctrica; João Camões - viola d'arco; Miguel Martins - composição, direcção, objectos; Pedro Castello-Lopes - percussões; Rui Godinho - piano; featuring Anabela Duarte (ex-Mler If Dada) - voz.

   

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RIO DE JANEIRO 

Hoje também, 26 de janeiro de 2013, "A Gentil Carioca" apresentará a 9ª edição do projeto Abre Alas. Criado e organizado pelos artistas e galeristas Marcio Botner, Laura Lima e Ernesto Neto desde 2006, a partir do trabalho de jovens artistas brasileiros, a exposição deste ano tem entre eles os poetas Fabiana Faleiros (Rio Grande do Sul, 1980) e Ícaro Lira (Ceará, 1986).

ARTISTAS ABRE ALAS 9

Bet Katona (RJ)
Bruno Baptistelli (SP)
Bruno Senise (RJ)
Camila Soato (Brasilia)
Fábia Schnoor (RJ)
Frederico Filippi (SP)
Gabriel Secchin (SP)
Gustavo Torezan (Piracicaba- SP)
Ícaro Lira (Fortaleza/Ceará)
Jaime Lauriano (SP)
Juan Parada (Curitiba)
Leonardo Akio (SP)
Oscar Barbery (Argentina)
Patricio Gil Flood (Argentina)
Rafael Perpétuo (Belo Horizonte)
RG Faleiros (SP)
Silvio de Camilis Borges (SP)


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RECIFE

Ocorre hoje, às 18:00 na Academia da Cidade do Coque, ao lado do viaduto Capitão Temudo, o lançamento da série de documentários para a TV "Coque: memórias da terra", realizado pela Rede Coque Vive e a Jacaré Vídeo, com incentivo do FUNCULTURA/FUNDARPE. 

"Neste momento de intensas intervenções urbanísticas no Coque, e em toda a Região Metropolitana do Recife, resgatar a história de formação do bairro e de luta da comunidade se faz mais do que justo e especial."



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quinta-feira, 24 de janeiro de 2013

Diálogos berlinenses (2)

A. __ Ai, você fala como se fizesse alguma coisa que a maioria dos poetas não faz. Vai, diga aí o que é que você acha que você faz tanto, que a maioria dos outros poetas não faz?

B. __ Sexo.

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quarta-feira, 23 de janeiro de 2013

Diálogos berlinenses (1)

A. __ O senhor teria um cigarro para mim?
B. __ Tenho.
A. __ Hã, o senhor também tem isqueiro?
B. __ Claro. O senhor precisa também dos meus pulmões ou fumar o senhor pode por conta própria?
A. __ Não, eu ainda devo ter meio pulmão. Mas, obrigado. Muito gentil.
B. __ Divirta-se.

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segunda-feira, 21 de janeiro de 2013

Dos heróis pessoais: James Baldwin (1924 - 1987)



“You think your pain and your heartbreak are unprecedented 
in the history of the world, but then you read. It was books 
that taught me that the things that tormented me most were 
the very things that connected me with all the people 
who were alive, or who had ever been alive.” ― James Baldwin


Eu me lembro da situação, de estar na sala de aula nos Estados Unidos. Era provavelmente 1995 e eu tinha ainda uns poucos meses no programa de intercâmbio antes de voltar para o Brasil. Não sei por que motivo a professora de Literatura Americana, professora que eu adorava, mencionou James Baldwin e seu primeiro romance, Go Tell It On The Mountain (1953). Talvez a conversa houvesse guinado para a questão racial, ou quem sabe para a questão religiosa nos Estados Unidos, ou suas interligações. 

Nós líamos um livro por mês em aula e tínhamos que escrever ensaios a respeito. Era a tortura para a maioria e um verdadeiro oásis para mim. Lembro-me de termos lido e discutido livros como as peças Long Day´s Journey Into Night (1956) e Cat On A Hot Tin Roof (1955), de Eugene O´Neill e Tennessee Williams, respectivamente; as novelas The Red Badge of Courage (1895), de Stephen Crane, e Of Mice and Men (1937), de John Steinbeck; coletâneas de contos como The Things They Carried (1990), de Tim O´Brien; e ainda romances como Ethan Frome (1911), de Edith Wharton, e o inclassificável Walden (1854), de Henry David Thoreau.

Quando Mrs. Peak (a professora) começou a descrever Baldwin, seu trabalho e sua importância para as Letras Americanas: e como fizera isso tudo sendo um escritor negro e homossexual assumido em plenas décadas de 50 e 60, eu me lembro de perguntar imediatamente a ela por que não líamos aquele romance em aula. Ela disse, com uma expressão que não saberia descrever: "Os pais de vocês não aprovariam se eu pusesse Baldwin nas mãos de vocês... mas, o que vocês fazem nas horas livres é assunto seu...", e escreveu na lousa em maiúsculas J A M E S B A L D W I N G O T E L L I T O N T H E M O U N T A I N

Eu entendi imediatamente a estratégia, ou, quem sabe, ela tenha simplesmente funcionado de cara comigo: sugerir que um livro era perigoso e proibido, para que a cabeçoila adolescente se interessasse.

Eu só começaria a ler o livro no ano seguinte, após retornar ao Brasil e então embarcar na minha primeira viagem para a Europa, depois de um ano trabalhando – literalmente dia e noite – para juntar o dinheiro. Li o livro de Baldwin em um barco, cruzando um certo mar, de uma civilização antiga para outra. Ali naquelas paragens onde poetas dizem correr um lamento milenar, que envolve os corpos das mulheres e das cabras e das pedras, fazendo com que às vezes até se confundam. E o livro de Baldwin me estripava, me carcomia as entranhas. É necessário ter crescido em um ambiente tão religioso quanto aquele em que cresci, imagino, para se poder compreender o que há de atormentado e tormentoso em um livro como Go Tell It On The Mountain. Segue sendo um dos livros mais fortes que já li, e uma das experiências literárias mais massacrantes que já tive.

É outro exemplo de afinidade est-É-tica minha com um escritor convulsivo, febril, enraivecido... como escritores tão diversos quanto Hilda Hilst; ou Kenzaburō Ōe; ou Emily Brontë; ou Heiner Müller. Não tanto, pelo menos para mim, com os estilistas frios. James Baldwin escreveu: “All art is a kind of confession, more or less oblique. All artists, if they are to survive, are forced, at last, to tell the whole story; to vomit the anguish up.” Sei o que quanto isso desagradará os de temperamento mais "seco e econômico". Mas é, ao menos, o único modus operandi do qual posso me dar ao luxo. 

Aprendi muito com Baldwin. É um de meus heróis pessoais. Convido vocês a ouvirem o próprio, nesta gravação de um excerto de seu "The Artist´s Struggle for Integrity". É tempo de voltar a ouvir Baldwin.




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sábado, 19 de janeiro de 2013

"Strawberry Leaves" (2012) + "Level Up" (2013), vídeo e composições sonoras de Akia (Uli Buder)

"Strawberry Leaves" (2012), Akia.

Akia é o nome artístico do produtor alemão Uli Buder, nascido em Hoyerswerda em 1986, vivendo e trabalhando em Berlim desde 2007 após crescer na cidade de Rostock, às margens do Mar Báltico. Foi ali, em Rostock, após notar a dificuldade em encontrar parceiros com os mesmos interesses para uma banda, que começou a produzir suas primeiras composições munido de um sintetizador Korg Electribe EMX 1, trabalhando sozinho, sob a influência inicial de produtores alemães como Console, Apparat e Micronaut. A música eletrônica minimalista contemporânea alemã permaneceria a maior referência em seu trabalho, unida a seu interesse pelo dub.




"Level Up" (2013), Akia

Nesta postagem, seu mais recente vídeo e composição sonora, "Strawberry leaves" (2012), logo no início, seguido acima de sua primeira produção em 2013, "Level Up". Abaixo, seu DJ set no evento que organizei na última terça-feira, celebrando os concertos de Anika e Trust no lendário Berghain. O aftershow foi no clube Loftus Hall.


Akia - Djset @ Loftus Hall - 15.01.2013 by AKIA - DJsets

É um dos meus colaboradores mais frequentes em peças sonoras e amigo queridíssimo.



sexta-feira, 18 de janeiro de 2013

Hoje estreia em São Paulo a peça "¡Salta!", colaboração entre Verônica Veloso e Veronica Stigger.


Verônica Veloso, diretora do Coletivo Teatro Dodecafônico

Hoje estreia em São Paulo a peça ¡Salta!, com direção de Verônica Veloso e texto de Veronica Stigger, a partir dos filmes de Lucrecia Martel. O trabalho colaborativo é marca do Coletivo Teatro Dodecafônico, fundado pela diretora goiana residente em São Paulo. O figurino é de Jorge Wakabara. Recomendo a vocês com todas as forças dos meus dedos, sendo Verônica Veloso e Veronica Stigger duas das artistas de minha geração por quem mais nutro respeito e admiração crescentes.

¡Salta! 
Sesc Santo Amaro
Rua Amador Bueno, 505 – Santo Amaro
Tel.: (11) 5541-4000
Sexta às 20h; sábado e domingo às 19h
Espetáculo não recomendado para menores de 16 anos
Em cartaz até 17/2/2013


Veronica Stigger

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quarta-feira, 16 de janeiro de 2013

(Re)Descobrindo Maria Ângela Alvim (1926 -1959)


Maria Ângela Alvim (1926 - 1959)

Ai, cânone maldito, que nos esconde belezuras de tal clareza logopaica como estas, de Maria Ângela Alvim (1926 - 1959):

DOIS POEMAS DE MARIA ÂNGELA ALVIM

Moro em mim? No meu destino, largado
partido em mil?
Moro aqui? Demoraria
sempre aqui, sem me saber - fugindo sempre
estaria?
Eis um lugar. Degredo
(de quê?). Dimensão se perseguindo
num sonho? - Sim, que me acordo.
Tudo existe circunstante
e ninguém para me crer.
Sou eu o sonho,
momento da ausência alheia (que devasso quase fria).
Morte, vida recente,
subindo em mim a resina,
ungüento de noite, amor.

As sombras e seus véus,
tantos véus - o mais sucinto
preso a meu corpo (aparente?)
me divide em dois recintos.
Um deles sendo equilíbrio
noutro posso me conter.
Avanço no sono aberto
até a altura do dia,
fria, fria,
mais fria, minha pele
filtra a aurora - neste tempo
aquela hora, seu pulso de instante e ocaso.

Eis que me encontro. Limite
de transparência e contato
entre a luz e meu retrato, na casta
parede - a louca?
Marulho d'água, caindo
dentro de mim, claridade.
Graça de mãos mais presentes,
que minhas mãos, já vazias
de sua forma, na palma.
Que gesto extenso as reteve
sempre além, configuradas?

E este azul, quase em branco
se desfazendo (na carne?).
Ah! Três retinas cortadas
de um prisma, se amanhecidas
nestes vidros, na vigília.
Ah! Três retinas pousadas
em ver, em ver contemplando
(ser, será o esquecimento
de quanto somos - pensando?).

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Quero crer-me este sentido
de longa memória branca.
Sobre ele não lembrar,
- ficar, ficar,
no encontro de tudo em pouco:
o tempo se refez no instante
deste espaço, superfície,
chão que nem me sustenta
(dura sou, eu, e dura amargura é a minha).

Não, não me lembrarei,
seria pensar começos
e outros fins - ó lunares
lembranças, doridos passos
(muitos fui acompanhando
de longe e mais me pisaram
aqui, ali, onde sei).

Estou? Se estou me consentem
os gestos e os movimentos?
Nenhum ruído se atenta
que dentro não fosse ouvido.
E tudo em mim se repete
enquanto durante e sempre
a lembrança vai baixando
a seu leito mais dormente.

Os pensamentos seriam
roteiros menos sofridos?
Deixá-los que se solveram
nestes noturnos tormentos
da mente se procurando,
da idéia, refluindo
sobre dúvida, distância
e certeza, aéreo marco
de um repouso em si medido.

Deixá-los. Deixar-me enquanto
existe um consenso oculto.
Pensarei que desvivi
num limite-lucidez
lá e, no entanto, aqui.

Maria Ângela Alvim, in Toda Poesia (org. Max de Carvalho, Lisboa: Assírio & Alvim, 2002).

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domingo, 13 de janeiro de 2013

Nota sobre a revista "Gratuita", de Portugal




Chegou às minhas mãos esta semana, gentilmente enviado pela poeta brasileira Júlia de Carvalho Hansen, um exemplar do primeiro número da revista Gratuita (Lisboa: Chão da Feira, 2012) Dedicado ao gênero epistolar, o volume traz cartas entre Furio Jesi e Károly Kerényi, Antonin Artaud e Jacques Rivière, Maria Gabriela Llansol e Eduardo Prado Coelho, a Quarta das "Cartas de um retornado", de Hugo von Hoffmannsthal, assim como poemas inéditos de Laura Erber, Luca Argel, Érica Zíngano e Ana Martins Marques, traduções inéditas para poemas de W.G. Sebald, uma entrevista com Giorgio Agamben, além de várias outras preciosidades. Fiquei particularmente interessado na correspondência entre Pier Paolo Pasolini, Francesco Leonetti e Roberto Roversi, em que discutem a fundação da revista Officina, editada por eles  na década de 50. Quem tiver a oportunidade de conseguir um exemplar, deve fazê-lo. Recomendo-a vivamente.

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sexta-feira, 11 de janeiro de 2013

Nota pessoal sobre o Prêmio Alphonsus de Guimaraens 2012, da Fundação Biblioteca Nacional.

Deixo registrado aqui meu desacordo com a falta de temperança com que se está conduzindo a discussão sobre o Prêmio Alphonsus de Guimaraens 2012, da Fundação Biblioteca Nacional. Em especial, à falta de respeito explícita a Carlito Azevedo, homem que sempre abriu as portas de sua revista a poetas não apenas muito vivos como muito jovens, e também à falta de respeito implícita ao trabalho hercúleo de Júlio Castañon Guimarães na organização do volume em questão. Pode-se discordar com veemência das decisões do júri. Eu mesmo, pessoalmente, discordo delas. Mas veemência nenhuma tornará elegante a atitude de algumas pessoas, usando a oportunidade para se comportarem com uma violência que só seria adequada se houvessem acabado de acometer contra a Bastilha.

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Último poema escrito em 2012: "Carta aos pobres poetas jovens"


Carta aos pobres poetas jovens

E escreve-se, mais. Belo consolo, poemas.
Obrigado pela nota, a de que, pelo menos,
meu furúnculo gotejou Cigarros na cama.
Mas ele não cobre meu corpo, completo.
Ninguém percebe que mesmo Tsvetáieva
sacrificaria, talvez, o seu “Poema do fim”
por um outono a mais com Rodzevitch?
Que a Plath tanta loa futura, ao seu Ariel,
não lhe sanou, de Hughes, os hematomas?
Vejo os documentários sobre W.H. Auden,
filmes proibidos sobre Ahkmátova, textos
dramatizando todas as chagas de Pasolini,
hagiografias para Pizarnik, as mil elegias
a Maiakóvski, Max Jacob, Desnos, Sexton.
Mendiga és tu entre as mulheres, Orides.
E o que haverá agora da histeria de Hilst?
Glamoriza-se a miséria, em vários pontos
pipocam poetas adolescentes, sem aviso
da pilhéria que serão os seus dias, tontos
com a luz dos holofotes dirigida a corpos,
cadáveres de gente que tão-só empunhara
penas e penas, canetas e pragas. Púcaros,
viveram como porcos, e as muitas pérolas
tampouco leões teriam digerido, ou cisnes.
Orgânicas, mas de baixo valor nutritivo.
E não durmo, as mãos tateando os bolsos
do paletó, em busca dos últimos poemas
no corpo que se exuma, mas não o meu,
ainda não meu, e sim de Miklós Radnóti.
Bem-vindos ao Olimpo-Hades, rapazotes.
Aqueles que já morreram ora nos saúdam.
Esbanjem pujança, desperdicem a saúde.
Agora fome, depois a lenda. Belo consolo,
belo, tenho tudo o que não devo, ou veto.

Ricardo Domeneck, dezembro, 2012.

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quinta-feira, 10 de janeiro de 2013

Traduzindo meu poema favorito de Audre Lorde

Uma litania para a sobrevivência

Para aqueles entre nós que vivem no litoral
em pé frente às arestas constantes da decisão
cruciais e sós
para aqueles entre nós que não podem dar-se ao luxo
dos sonhos passageiros da decisão
que amam de passagem por soleiras
nas horas entre auroras
olhando para dentro e para fora
no instante antes e depois
buscando um agora que possa gerar
futuros
como pão na boca de nossos filhos
para que seus sonhos não reflitam
a nossa morte:

Para aqueles entre nós
que foram impressos com o medo
como uma linha tênue no centro de nossas testas
aprendendo a temer com o leite de nossas mães
pois por esta arma
esta ilusão de alguma segurança a ser achada
os de passos pesados esperavam silenciar-nos
Para todos nós
esse instante e esse triunfo
Nunca fomos destinados a sobreviver.

E quando o sol se ergue temos medo
que talvez não permaneça
quando o sol se põe temos medo
que talvez não se erga de manhã
quando nossos estômagos estão cheios temos medo
da indigestão
quando nossos estômagos estão vazios temos medo
que talvez nunca mais comamos
quando nós amamos temos medo
que o amor desaparecerá
quando estamos sós temos medo
que o amor jamais voltará
e quando falamos temos medo
que nossas palavras não sejam ouvidas
nem benvindas
mas quando estamos em silêncio
ainda assim temos medo

Então é melhor falar
lembrando-nos
de que nunca fomos destinados a sobreviver

(tradução de Ricardo Domeneck)

:

A litany for survival
Audre Lorde

For those of us who live at the shoreline
standing upon the constant edges of decision
crucial and alone
for those of us who cannot indulge
the passing dreams of choice
who love in doorways coming and going
in the hours between dawns
looking inward and outward
at once before and after
seeking a now that can breed
futures
like bread in our children's mouths
so their dreams will not reflect
the death of ours:

For those of us
who were imprinted with fear
like a faint line in the center of our foreheads
learning to be afraid with our mother's milk
for by this weapon
this illusion of some safety to be found
the heavy-footed hoped to silence us
For all of us
this instant and this triumph
We were never meant to survive.

And when the sun rises we are afraid
it might not remain
when the sun sets we are afraid
it might not rise in the morning
when our stomachs are full we are afraid
of indigestion
when our stomachs are empty we are afraid
we may never eat again
when we are loved we are afraid
love will vanish
when we are alone we are afraid
love will never return
and when we speak we are afraid
our words will not be heard
nor welcomed
but when we are silent
we are still afraid

So it is better to speak
remembering
we were never meant to survive





Audre Lorde foi uma poeta americana, nascida em Nova Iorque a 18 de fevereiro de 1934, em uma família de imigrantes do Caribe. Começou a publicar na década de 60, na revista de Langston Hughes, New Negro Poets, USA. Neste período, engajou-se nos movimentos Feminista, Anti-Guerra e dos Direitos Civis. Seu livro de estreia foi The First Cities (1968), publicado pela editora Poet´s Press e editado por Diane di Prima. Seu segundo livro, de 1970, foi Cables to rage, seguido de volumes como From a Land Where Other People Live (1973), Coal (1976), Between Our Selves (1976), The Black Unicorn (1978) e The Cancer Journals (1980). Entre 1984 e 1992, ano de sua morte, a poeta viveu e trabalhou em Berlim, Alemanha, período sobre o qual a diretora Dagmar Schultz lançou, no ano passado, o documentário Audre Lorde: The Berlin Years (1984 - 1992).



O ativismo feminista de Audre Lorde foi importante e polêmico, ao acusar o Movimento Feminista norte-americano, dominado por ensaístas e ativistas brancas, de ignorar a questão racial do problema, e por focar-se nas experiências de mulheres brancas da classe média. Audre Lorde insistiu que questões de raça, sexualidade, idade, classe e até mesmo saúde influíam e definiam as experiências particulares de cada mulher, e precisavam, portanto, ser abordadas de formas específicas. Suas ideias influíram sobre o conceito de interseccionalidade nos estudos políticos da opressão contra minorias. No documentário A Litany for Survival: The Life and Work of Audre Lorde, de Ada Gay Griffin e Michelle Parkerson, Lorde diz:

"Let me tell you first about what it was like being a Black woman poet in the ‘60s, from jump. It meant being invisible. It meant being really invisible. It meant being doubly invisible as a Black feminist woman and it meant being triply invisible as a Black lesbian and feminist."


Lutando contra o câncer desde 1978, primeiro o câncer de mama (o que exigiria uma mastectomia), e depois no fígado, Audre Lorde morreu a 17 de novembro de 1992.


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terça-feira, 8 de janeiro de 2013

"Edad de oro: antología de poesía mexicana actual" (UNAM, 2013), com organização e prefácio de Luis Felipe Fabre



O grande Luis Felipe Fabre organizou e prefaciou o volume Edad de Oro: Antología de Poesía Mexicana Actual, lançada agora pela Universidad Nacional Autónoma de México - UNAM, não apenas com alguns dos melhores poetas mexicanos nascidos nos anos 70 e 80, mas alguns dos melhores poetas que conheço em minha geração e na seguinte, incluindo a arqueologopaica Paula Abramo, o maestro métrico Óscar de Pablo, o manual de passos de dança para o intelecto conhecido como Daniel Saldaña París, e o melômano genial Alejandro Albarrán, assim como Rodrigo Flores Sánchez, Maricela Guerrero, Minerva Reynosa, Inti García Santamaría e Yaxkin Melchy. Hipérboles são a única reação apropriada para o acontecimento. UNAM-se.

--- Ricardo Domeneck

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domingo, 6 de janeiro de 2013

Quatro poemas de António Barahona (Lisboa, 1939)


Poemas de António Barahona (Lisboa, 1939)

Cadáver esquisito heterodoxo com João Rodrigues no Café Gelo em 1961

Intimidade côr de bombazina
a cercar uma aranha de bambú
passa um polícia a cheirar a benzina
parte-se uma vidraça e surges tu

Sobrenadavam carpas na baía
um novo ritmo que vem de Las Vegas
daquele lado já nada se ouvia
quadrilha de gaivotas quase cegas

Por dentro era o som dum violino
por fora havia um vago marulhar
menos que nunca penso no destino
e bebo a tua sombra devagar.

§

No aniversário da diva

Passam por nós os anos, ígneos pássaros
apressados, e caem muitas penas
Passam por nós os anos: são cavalos
nervosos frente aos toiros nas arenas

Mas não envelhecemos sempre esperançados
na juventude eterna que não deixa marcas
Estamos marcados desde que nascemos,
transviados por onde não há estradas:

somente caminhadas sem sair de becos,
miragens de desertos nos confins das ilhas
Passam por nós os anos e só fica
um sulco que se fecha na memória em ferida

§

Calmaria

Clepsydra do Khalifa a lume da memória:
gotas d´água a cair no Poema Final
em um Livro pequeno, mas Grande Vitória,
de Camillo Pessanha, o Guerreiro Abismal.

E leio. E releio. E respiro vocal

este tempo medido em cascatas às cores,
em Flautas Incesssantes e em Barcos de Flores.

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Remember

Lembro, em primeiro plano,
tua estatura de planta
e recomeço a esculpir-te
em miolo de pão, pétala a pétala.




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sexta-feira, 4 de janeiro de 2013

Traduzindo Jürgen Becker



Postagem publicada originalmente na Modo de Usar & Co.

Jürgen Becker é um poeta, prosador e dramaturgo alemão, nascido na cidade de Colônia, a 10 de julho de 1932. O poeta cresceu em Erfurt, retornando a sua cidade natal para seus estudos de nível colegial. Entre 1959 e 1964, trabalhou na Westdeutschen Rundfunk (Radiodifusora Alemã Ocidental), e, entre 1964 e 1966, na editora Rowohlt. Em 1967, foi convidado a ler e então premiado pelo então-influente Grupo 47. 

A partir de 1968, dedica-se exclusivamente à escrita. Jürgen Becker é membro do grupo P.E.N. alemão, da Academia das Artes de Berlim (Akademie der Künste Berlin) e da Academia Alemã para Língua e Poesia (Deutschen Akademie für Sprache und Dichtung), e recebeu ainda alguns dos prêmios  mais prestigiosos da língua, como o Prêmio Peter Huchel (Peter-Huchel-Preis, 1994) e o Prêmio Heinrich Böll (Heinrich-Böll-Preis, 1995). O poeta vive nos arredores de Colônia.

Os três poemas abaixo foram traduzidos a pedido da Oficina de Literatura de Berlim (Literaturwerkstatt Berlin), para sua página de poesia vocalizada.


--- Ricardo Domeneck





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POEMAS DE JÜRGEN BECKER

O que há por ser alcançado

A hora seguinte. Como se alguém fosse esperar. Mas
as obrigações não param, sobre os dejetos não queremos
nem falar.

Lá fora está claro bastante. Não se exigem
requisições nenhum assunto para o editorial; eu direi tudo
com bastante antecedência.

É realmente muito simples. De costas para a parede,
para a janela, para a tela, para a porta. Não traga nada,
agora a mesa ficará vazia.

(tradução de Ricardo Domeneck)

:

Was zu erreichen ist

Die nächste Stunde. Als würde man warten. Aber
die Beschäftigungen gehen weiter, von den Altlasten wollen wir
gar nicht erst reden.

Hell genug ist es draußen. Es bedarf keiner
Aufforderung kein Motiv für den Leitartikel; ich sag dir
alles früh genug.

Es ist wirklich ganz einfach. Mit dem Rücken zur Wand,
zum Fenster, zum Bildschirm, zur Tür. Nichts mitbringen,
der Tisch bleibt jetzt leer.


§

Chuva de verão. Noite negra. No canto

{à memória de Donald Barthelme}

Chuva de verão. Noite negra. No canto
de um obituário as datas disponíveis rabiscadas
que deram andamento à entrevista, a lembrança
de encontros de sonho, dos quais
nos prometêramos mais futuro.

A nova edição da New Yorker fica aberta.
O que significa futuro, quando a última conversa
deixa-se repetir eternamente na fita rotatória
e um necrológio fica dez anos em arquivo.
Verão de seca. A noite tão clara.

Uma viagem espera os preparativos. Tem-se
que atravessar o nevoeiro, do qual o branco
é tão branco quanto o luto chinês. Sem citações,
por favor. Assunto encerrado. Os campos de cevada
vazios, e lê-se que complicadas são as cidades.

(tradução de Ricardo Domeneck)

:

[Sommerregen. Schwarzer Abend. An den Rand]

In memoriam Donald Barthelme

Sommerregen. Schwarzer Abend. An den Rand
einer Todesmeldung gekritzelt die verfügbaren Daten,
die das Interview in Gang setzen, die Erinnerung
an entrückte Begegnungen, von denen
wir uns mehr Zukunft versprochen hatten.

Der neue New Yorker bleibt offen liegen.
Was heißt Zukunft, wenn sich das letzte Gespräch
per Bandschleife endlos wiederholen läßt
und ein Nachruf zehn Jahre liegt im Archiv.
Trockener Sommer. Der Abend ist hell.

Eine Reise ist vorzubereiten. Man muß
durch eine Nebelfront, deren Weiß so weiß
wie chinesische Trauer ist. Bitte keine Zitate.
Thema vom Tisch. Die Gerstenfelder sind leer,
und man liest, kompliziert sind die Städte.


§

Anel Viário

Ergo os olhos, a formação de grous
troca a base do seu V, a direção
do voo segue a mesma, a velocidade
não muda, alguns gritam, então gritam
outros, a formação distancia-se entre
as cidades que estão em silêncio no ar.

(tradução de Ricardo Domeneck)

:

Autobahnring

Hochblickend, die Kette der Kraniche,
sie wechselt gerade die Keilspitze aus,
die Flugrichtung bleibt, die Geschwindigkeit
ändert sich nicht, einige schreien, dann
schreien andere, die Kette entfernt sich zwischen
den Städten, die still sind in der Luft.


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quarta-feira, 2 de janeiro de 2013

Livros em 2012 - algumas recomendações

Esta postagem não pretende apontar os melhores livros de 2012, pois para isso eu teria que haver lido tudo ou quase tudo que foi lançado no Brasil e no mundo no ano passado. Morando fora do país, é mais difícil manter-me informado, mas procuro acompanhar o trabalho de meus contemporâneos, assim como muita coisa me chega através da pesquisa que faço constantemente para a Modo de Usar & Co.

A lista abaixo é formada por alguns livros que li neste ano que se encerrou e que eu gostaria de recomendar. Não sei se são os melhores. Alguns me despertaram entusiasmo, outros provaram o respeito que já nutria pelos poetas, alguns foram surpresas, de poetas que não conhecia. É muito provável que eu esteja me esquecendo, por ora, de livros que li no começo do ano e agora me fugiram à mente. A lista provavelmente crescerá nos próximos dias. Estes são alguns poetas que acompanho, também, com interesse especial. São todos livros que eu gostaria de ter resenhado quando os li, mas acabei não podendo por falta de tempo. 2012 foi um ano bastante cheio, de festivais e outras obrigações que me mantiveram um pouco afastado do debate crítico, se comparado com outros anos.

Ordem alfabética por nome do autor. Vocês verão que eu privilegiei o trabalho de meus contemporâneos, autores de minha geração, ou de uma geração imediatamente anterior ou posterior. Sei que o conceito de "geração" anda em baixa, e eu mesmo o questiono e venho há tempos querendo escrever a respeito. Por ora, uso-o aqui com parcimônia. Há casos ainda de alguns livros que não tive a chance de ter em mãos e conhecer na íntegra. São livros pelos quais, lidos parcialmente por poemas disponibilizados na Rede, entusiasmei-me o suficiente para estar à caça dos volumes. Repito: são recomendações, só isso.


Brasil. Poesia. 2012.

Angélica Freitas - Um Útero É Do Tamanho De Um Punho (São Paulo: Cosac Naify, 2012).
Luca Argelesqueci de fixar o grafite (Rio de Janeiro: 7Letras, 2012).
Luci Collin - Trato de silêncios (Rio de Janeiro: 7Letras, 2012).
Marco Catalão – Sob a Face Neutra (São Paulo: Funarte, 2012).
Marcus Fabiano GonçalvesArame Falado (Rio de Janeiro: 7Letras, 2012).
Marília Garcia - engano geográfico (Rio de Janeiro: 7Letras, 2012).
Paulo Henriques Britto - Formas do Nada (São Paulo: Companhia das Letras, 2012).
Veronica Stigger - Delírio de Damasco (Florianópolis: Cultura e Barbárie, 2012). :::::::::::: Confesso conhecer apenas o longo poema "O coração dos homens", incluído neste volume. Mas basta para que todo o livro valha, e, dada a qualidade da autora em questão, tenho certeza de que os outros textos do livro são igualmente bons.

Lançados em 2011, mas lidos em 2012:

Ana Martins Marques - Da arte das armadilhas (São Paulo: Companhia das Letras, 2011).
Bruno Brum - Mastodontes na Sala de Espera (Belo Horizonte: Crisálida, 2011).
Horácio Costa - Ciclópico olho (São Paulo: Annablume, 2011).

Portugal. Poesia. 2012.

Miguel Martinsfôlego sem folga (Lisboa: Língua Morta, 2012).  :::::::::::::: O livro é, na verdade, inclassificável. Poderia facilmente ser também chamado de novela. Tudo o que posso dizer é que se trata de excelente texto. O autor lançou também a coletânea de poemas Cãibra (Lisboa: Ediresistência, 2012), que ainda não pude ler. Trata-se, em minha opinião, de um dos melhores poetas em atividade na língua.
Inês Lourenço - Câmara escura - uma antologia (Lisboa: Língua Morta, 2012).
Manuel de Freitas - Cólofon (Lisboa: Fahrenheit 451, 2012).

Brasil. Prosa. 2012.

Victor Heringer - Glória (Rio de Janeiro: 7Letras, 2012).

Línguas Estrangeiras. Poesia. 2012.

Alejandro Albarrán - Ruido (Ciudad de México: Bonobos, 2012).
Antoine WautersCésarine de nuit (Paris: Editions Cheyne, 2012).
Black Cracker - 40oz Elephant (New York: Bowery Books, 2012).
Daniel Saldaña París - La Máquina Autobiográfica (Ciudad de México: Bonobos, 2012).
Dominique Meens - Vers (Paris: POL, 2012).
Gerhard Falkner - Pergamon Poems (Berlin: kookbooks, 2012).
Hendrik Jackson - Im Licht der Prophezeiungen (Berlin: kookbooks, 2012).
Johannes CS Frank - Remembrances of Copper Cream (Berlin: Fixpoetry, 2012).
Max CzollekDruckkammern (Berlin: Verlagshaus J. Frank, 2012).
Monika Rinck - Honigprotokolle (Berlin: kookbooks, 2012).
Paul Legault - The Emily Dickinson Reader - an English-to-English Translation 
of Emily Dickinson´s Complete Poems (McSweeney's, 2012).
Paula Abramo - Fiat Lux (Ciudad de México: Tierra Adentro, 2012).
Shane Anderson - Études des Gottnarrenmaschinen. (Berlin: Broken Dimanche Press, 2012).
Swantje Lichtenstein - Horae (Berlin: Verlagshaus J. Frank, 2012).


::::::::::::::::::: Livros que me marcaram em 2012 :::::::::::::::::::::



Adrienne Rich - What Is Found There - Notebooks on Poetry and Politics (1993).
José Revueltas - Cuentos.
Viktor Shklovsky - Zoo, or Letters Not About Love (1922).
W.G. Sebald - Die Ringe des Saturn: Eine englische Wallfahrt (1995).
William H. Gass - Cartesian Sonata (1998).


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